A compra dos respiradores fantasmas é um fardo político que Carlos Moisés (sem partido) vai carregar até o fim das eleições do ano que vem, eleito ou reeleito governador. Inocentado previamente de envolvimento criminal com a quadrilha que lesou o Estado em R$ 33 milhões pagos por 200 equipamentos essenciais e escassos naqueles primeiros dias de combate à pandemia do coronavírus, o governador responderá politicamente pelo caso, uma marca indelével em sua gestão – como uma cicatriz. Essa é a má notícia para. A boa notícia, no entanto, é que a denúncia do Ministério Público de Santa Catarina (Mp-SC), após mais de um ano de investigações, não aumenta o peso desse fardo que Moisés já carrega.

A denúncia apresentada na tarde de quarta-feira, ainda em segredo de justiça, não conseguiu mostrar que a quadrilha criada para ludibriar o Estado tenha sido integrada por membros do governo Moisés. É sobre os empresários que formam o suposto conluio que recaem as acusações de organização criminosa e corrupção. Os dois nomes emblemáticos do governo na investigação – os ex-secretários Douglas Borba (Casa Civil) e Hélton Zeferino (Saúde) – não respondem por esses crimes. Sobre os servidores da Saúde envolvidos também são apontados crimes menores – como peculato culposo (cometeram erros administrativos que propiciaram a ação da quadrilha, sem fazer parte dela).

Ou seja, Moisés poderá dizer que a corrupção não estava dentro do governo. Houve imperícia, incompetência, açodamento, erros administrativos, mas não corrupção. É uma peça importante na narrativa que será apresentada ao eleitor quando o governador for questionado sobre os R$ 33 milhões pagos antecipadamente por respiradores nunca entregues. Não é à toa que Moisés apresentou semana passada um site em que detalha os procedimentos do governo para recuperar os recursos – segundo ele, 96% deles já bloqueados judicialmente.

A peça assinada por sete promotores de Justiça não foi além do que se apresentou sobre o esquema lá na CPI dos Respiradores, o circo político montado pela Assembleia Legislativa em cima das investigações realizadas até então pela Polícia Civil e o Mp-SC. Claro que lá as tintas foram carregadas para fazer de Carlos Moisés e Douglas Borba vilões de filme noir, mas já era possível constatar que a compra dos respiradores havia sido possível graças à ação de empresários espertos sobre uma atrapalhada equipe de servidores públicos liderada por Hélton Zeferino. O papel de Borba teria sido o de apresentar os espertos aos atrapalhados.

A denúncia vai nessa mesma linha, sem as tintas carregadas. O caso de Borba é basilar sobre o que a investigação propôs e sobre o que conseguiu apresentar. Em maio de 2020, quando foi preso preventivamente na Operação O2, Douglas Borba era apontado como suspeito dos crimes de organização criminosa, corrupção, lavagem de dinheiro, peculato e por crime contra a administração pública. Um ano e três meses depois, ele não foi denunciado por nenhum desses crimes. Sobrou a imputação por estelionato e obstrução das investigações, que serão analisados agora pelo Judiciário.

Assim, pode-se perceber que a denúncia pesa sobre o núcleo empresarial e alivia o núcleo político do rumoroso caso dos respiradores fantasmas. Politicamente, o episódio foi pretexto para derrubar um governo – a atrapalhada gestão da chamada nova política que não queria conversa com a velha, liderada por Moisés e Borba. Em seu lugar, alçou-se ao poder o governo bem articulado e aberto à política liderado por Moisés e Eron Giordani. Ficou quem soube se adaptar. O resto virou tão fantasma quanto os respiradores que Santa Catarina pagou sem receber.


Sobre a foto em destaque:

Moisés em uma das lives que protagonizou no início da pandemia, quando tinha Douglas Borba e Hélton Zeferino como principais auxiliares. Foto: Maurício Vieira, Secom.

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