Sempre alerto que mais importante que os números das pesquisas eleitorais são as curvas que se projetam na sequência de levantamentos. Era com base neles, mesmo com os resultados díspares que apresentavam os institutos, que foi possível perceber que existia a chance real da eleição catarinense nacionalizar e reproduzir por aqui um segundo turno entre o Partido Liberal (Pl) do presidente Jair Bolsonaro e o Pt do ex-presidente Lula. Na reta final, apenas Jorginho Mello (Pl) e Décio Lima (Pt) cresciam enquanto as demais candidaturas, especialmente Carlos Moisés (Republicanos), Gean Loureiro (União) e Esperidião Amin (Progressistas) davam sinais de terem chegado ao limite. A dúvida era se havia tempo para 0 13 lulista fazer Décio ultrapassar os concorrentes.
Este tabu foi quebrado. Pela primeira vez, um partido de esquerda chega ao segundo turno da eleição catarinense. O Pt chegou muito perto em 2002, quando a primeira eleição de Lula produziu uma onda no Estado – elegeu nove deputados estaduais, cinco federais, uma senadora. Naquela disputa, faltaram cerca de dois pontos percentuais para José Fritsch ultrapassar Luiz Henrique da Silveira e disputar o segundo turno com Amin. Em 2010, com uma campanha financeiramente robusta e Lula, em fim de segundo mandato, ostentando altos índices de popularidade, Ideli Salvatti chegou perto de ultrapassar Angela Amin e ficar em segundo – mas aquela disputa a tríplice aliança garantiu em primeiro turno para Raimundo Colombo.
Neste domingo, Décio fez menos votos do que Ideli em 2010. O cenário é outro, fragmentado. Há meses existe a avaliação de que a fragmentação das candidaturas à direita e ao centro criava uma avenida livre para a candidatura atrelada a Lula em Santa Catarina. Como estrategista, o ex-deputado estadual Gelson Merisio (Solidariedade), segundo colocado na eleição para governador de 2018, virou uma espécie de coach de Décio e prometeu a Lula que quebraria o tabu. Para os petistas, a chegada ao segundo turno em Santa Catarina significa manter a campanha viva no Estado, trazer a imagem do líder petista para o horário eleitoral também na disputa local. Especialmente, significa não ter que improvisar palanques – como Lula fez com Luiz Henrique em 2002 e com Amin em 2006.
Quebrado o tabu, Décio e Merisio tem um outro desafio. O bolsonarismo explicitado pelo eleitor catarinense no primeiro turno – 11 deputados estaduais, seis federais, o ex-desconhecido Jorge Seif conquistado o Senado com facilidade contra o ex-governador Raimundo Colombo (Psd) e o senador Dário Berger (Psb) – faz de Jorginho Mello mais do que favorito para vencer a disputa no segundo turno. O poder exala antes mesmo de ser conquistado. Nos próximos dias, o senador que chegou a ser apelidado de “Sozinho Mello” para dificuldade de atrair aliados de outros partidos para seu palanque deve passar a ser muito atrativo para alianças.
Aconteça o que acontecer em Santa Catarina no segundo turno, a esquerda já tem o que comemorar. Desde 2010, o Pt perdia sucessivamente espaço eleitorado no Estado – cada eleição era um rosário de más notícias, de azares. A candidatura presidencial de Lula estancou a queda. Décio no segundo turno, Ana Paula Lima se somando a Pedro Uczai na Câmara dos Deputados, a manutenção das quatro cadeiras na Assembleia Legislativa com o acréscimo da primeira vitória de uma candidato do Psol para o parlamento estadual, o vereador florianopolitano Marquito.
As próximas três semanas vão mostrar se a esquerda tem condições de comemorar mais do que uma participação especial na eleição catarinense.
Sobre a foto em destaque:
Bia Vargas (Psb), candidata a vice-governador, com Décio Lima e a deputada federal eleita Ana Paula Lima. Foto: Divulgação.