Criar expectativas é sempre um risco, porque é muito difícil que o real contemple plenamente o imaginado. Desde que o governador Carlos Moisés (ex-Psl) foi às redes sociais, em junho, anunciar uma nova era na educação catarinense em que nenhum professor graduado ganharia menos de R$ 5 mil por 40 horas de trabalho, o magistério entrou em polvorosa com a expectativa de uma valorização sempre almejada pela categoria. Em agosto foi aprovada a emenda constitucional que garantiu a remuneração mínima e atendeu especialmente os professores com menos tempo de serviço e temporários, com a promessa de que logo viriam as novas tabelas que fariam a chamada descompactação da carreira.

Após meses de expectativas geradas, o projeto de lei com os novos valores referência do plano de carreira do magistério aportaram na manhã de terça-feira na Assembleia Legislativa. Foi levado pelos secretários Eron Giordani (Casa Civil), Jorge Eduardo Tasca (Administração) e Luiz Fernando Vampiro (Mdb, Educação), simbolizando o esforço multitarefa do governo estadual em sua elaboração. A reação da categoria diante dos números apresentados mostra que a realidade mais uma vez ficou aquém do imaginado e que teremos semanas de ampla discussão no parlamento.

Assim que o tema ganhou visibilidade com o tweet de Moisés, escrevi aqui que Santa Catarina tinha uma janela histórica para mudar a patamar salarial dos professores estaduais. Esse foi o tamanho da expectativa gerada e tinha como base concreta duas condições: o salto arrecadatório do Estado a ampliar o bolo dos 25% obrigatórios do gasto com educação e o limite de gastos com folha; os novos patamares de gasto obrigatório com remuneração dos professores no novo Fundeb, aprovado no final de 2020. Sindicalistas e professores, no entanto, sempre mostraram alguma desconfiança. Afinal, trata-se de uma categoria que precisou fazer uma greve de 62 dias, lá no primeiro ano de governo de Raimundo Colombo, 2011, para que o Estado cumprisse a lei nacional do piso dos professores. Nunca nada é muito fácil para os professores.

Outro fator de expectativa foi a atuação de uma comissão mista criada na Assembleia Legislativa para debater a elaboração do novo plano de carreira, presidida pela deputada estadual Luciane Carminatti (Pt) e com relatório final do deputado estadual Vicente Caropreso (Psdb). Esse relatório foi enviado ao governo no início de setembro com a expectativa – olha a palavra aí de novo – de que subsidiasse as discussões técnicas em andamento no governo estadual. A petista e o tucano estavam entre os deputados que receberam o trio de secretários na antessala do presidente da Alesc, Mauro de Nadal (Mdb). Luciane Carminatti, especialmente, mostrou desconforto assim que viu que os números apresentados pelo governo ignoravam o trabalho da comissão.

– É a primeira vez que vejo um governo vir à Alesc entregar um projeto, sem entregar. Como ainda não tive acesso ao documento, só posso dizer que as propostas anunciadas, por enquanto só de boca, não consideram o trabalho da Comissão Mista, inédita no âmbito do funcionalismo público, que teve prazo estendido para atender o governo, reunindo ainda sindicato, Tribunal de Contas do Estado e economistas – disse a deputada ainda durante a tarde, antes que o projeto fosse protocolado.

As tabelas do novo plano de carreira vieram à tona de forma inusitada na tarde de terça-feira, com uma postagem no perfil de Instagram da Secretaria de Educação. Causaram uma comoção entre os professores, que aguardavam com expectativa os detalhes dos aumentos previstos para cada faixa salarial – especialmente após Moisés aproveitar o dia do professor, 15 de outubro, para anunciar que o novo plano levaria a remuneração final da categoria para a faixa dos R$ 11 mil.

Imediatamente, o Sinte também usou o Instagram para apresentar um comparativo entre a tabela apresentada pelo governo e a construída na Alesc, dizendo que não concorda com os números do governo. De acordo com o sindicato, os R$ 11 mil anunciados por Moisés – a última linha da remuneração final para professores com doutorado – contemplam 0,34% do quadro de professores. O reajuste salarial para os profissionais com mestrado não atingiria 5% dos docentes. Para a grande maioria, o reajuste ficaria em torno de R$ 300 mensais. Pouco para a expectativa criada. Observando os números da tabela do governo, é visível que boa parte da categoria continuará escorada na emenda constitucional que garante a remuneração mínima de R$ 5 mil.

Quando se fala em aumento para os professores, é preciso gerenciar os números e também as expectativas. Pelo volume de profissionais em questão – 77 mil pessoas -, todo real a mais tem impacto profundo na folha de pagamento do Estado. Em 2015, o plano de carreira aprovado no segundo mandato de Colombo também foi extremamente criticado pela categoria e mesmo assim gerou um salto nos gastos com funcionalismo de difícil digestão nos anos seguintes. As tabelas apresentada agora pelo governo geram um custo extra de R$ 287.647.367,78 em 2022, beirando os R$ 300 milhões nos dois anos seguintes. Moisés promete que o plano de carreira será acompanhado por outros gestos de valorização do magistério.

– Em 2022, vamos investir mais de R$ 1 bilhão na valorização dos professores com a política de remuneração mínima e o reajuste da tabela do magistério. O reajuste da tabela se soma aos investimentos nas bolsas de pós-graduação para que os professores se especializem e obtenham títulos de mestres e doutores. Assim asseguramos as condições para que os profissionais progridam na carreira, qualificando a educação catarinense como um todo – disse o governador.

Preparem-se, todos, para que fortes discussões e ameaças de greve nas próximas semanas. A Alesc terá agora o papel de gerenciar uma equação entre o real, o imaginado e o possível. E também para enfrentar o sentimento comum às grandes expectativas: a frustração.


Sobre a foto em destaque:

Entrega do projeto de lei com a nova tabela salarial dos professores. Da esquerda para a direita: Jorge Eduardo Tasca (secretário da Administração), José Milton Scheffer (Pp, líder do governo), Eron Giordani (Casa Civil), Volnei Weber (Mdb), Mauro de Nadal (Mdb, presidente da Alesc), Luiz Fernando Vampiro (Mdb, secretário da Educação), Vicente Caropreso (Psdb), Luciane Carminatti (Pt) e Júlio Garcia (Psd). Foto: Bruno Collaço, Agência AL. 

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