O governo Carlos Moisés (sem partido) conviveu por um final de semana inteiro e boa parte da segunda-feira com os rumores de que a repentina decisão de Akira Sato de deixar o cargo de delegado-geral da Polícia Civil tinha relação com a pressão para que ele substituísse delegados que investigavam um suposto esquema de fraude na contratação de um software de gestão. Conhecido como linha dura e ex-comandante da Deic (Diretoria Estadual de Investigações Criminais), ele ficou menos de duas semanas no cargo e foi substituído na noite de segunda-feira por Marcos Ghizoni, que comandou a Polícia Civil no governo Eduardo Pinho Moreira (Mdb). Foram quase quatro dias de silêncio no Centro Administrativo e muitas narrativas nas redes sociais e na oposição.

A recomposição da imagem pública do governo Moisés após o escândalo dos respiradores e dos processos arquivados de impeachment está umbilicalmente ligada à ideia de que a desastrosa compra foi um caso isolado e combatido em uma gestão marcada por transparência, redução de gastos e revisão de contratos que geraram milhões em economia aos cofres públicos. Essa narrativa não combina com a ideia de que o governo abafa investigações. Isso explica os dois movimentos dos últimos dias. O de extrema cautela do governo para evitar contradições de discurso; a sanha dos oposicionistas mais contundentes de Moisés na Assembleia Legislativa, Kennedy Nunes (Ptb) e Ivan Naatz (Pl).

A dupla falou sozinha entre sexta e segunda-feira. Kennedy apresentou narrativas que ligavam o caso a coronéis da reserva, Naatz falou em ressuscitar uma proposta de emenda à Constituição apresentada por Leonel Pavan (Psdb) quando assumiu o cargo de deputado estadual em 2015 que previa lista tríplice eleita pela categoria para o cargo de delegado-geral. A tímida defesa do governo veio notas oficiais e uma entrevista do líder do governo na Alesc, Zé Milton Scheffer, à Rádio Som Maior, pedindo cautela sobre os rumores.

Aliás, não vou detalhar neste texto o que foi especulado porque me parece prematuro. O importante agora é que a investigação sobre o caso seja blindada, protegida. Estarão todos atentos e o governo deve ser o primeiro a ficar atento e, confirmados os rumores, estar pronto para extirpar o problema e punir eventuais culpados. É o que se espera de Ghizoni e nada em sua ficha indica o contrário. Ao anunciá-lo, Moisés agradeceu Akira Sato pela breve passagem e disse contar com ele “quando se restabeleça”. A versão oficial para a saída do delegado do cargo é problemas de saúde. Diante de tudo que foi falado e deixado falar nesses dias, é imperioso que Sato seja ouvido – sob pena de prosperarem as narrativas que o governo não quer que prosperem.

Outro ponto que o governo deve levar em conta neste momento, no entanto, não é relacionado especificamente à investigação que teria sido alvo de pressão interna. É a própria relação com a categoria dos policiais civis. A saída de Paulo Koerich do comando da instituição, em setembro, seria devido à dificuldade de controlar os ânimos da categoria após a reforma da previdência estadual – quando pleiteavam equiparação em relação aos policiais militares, beneficiados pela reforma da previdência aprovada no Congresso Nacional. Mais do que uma insatisfação corporativa, comum após esse tipo de reforma, aqui se reforça uma rivalidade construída no tempo e que parecia minimamente pacificada no começo do governo Moisés. Estava adormecida.

Foi da base da Polícia Civil que surgiram os rumores e que a questão se alastrou nas redes sociais. Se o governo Moisés não restabelecer um diálogo produtivo com a categoria, conviverá até o fim do mandato com uma oposição muito mais perigosa que a de Kennedy Nunes e Ivan Naatz.


Sobre as fotos em destaque:

Sai Akira, entra Ghizoni. Só a troca não resolve a crise. Fotos: Ricardo Wolffenbüttel, Secom.

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