Que o governador Carlos Moisés (sem partido) deseja ser candidato à reeleição e trabalha para isso até os canhões da Casa da Agronômica sabem. Quando anunciou a saída do incômodo Psl, em julho, com a promessa de focar na gestão do Estado, ele fez um movimento importante na construção da narrativa que deve balizar sua segunda disputa pelo governo, desta vez apartado de ondas eleitorais. No entanto, foi nesta semana que Moisés viveu dois momentos emblemáticos para a construção do discurso para 2022.

No discurso propositivo, o investimento de recursos do Estado em obras nas rodovias federais é uma das peças principais. Por isso, foi feita a operação político-financeira desencadeada para que o governador não voltasse de Brasília sem solução para o impasse técnico-político para o uso de R$ 200 milhões estaduais nos lotes 1 e 2 da BR-470. O Vale do Itajaí concentra o maior eleitorado do Estado, disperso em diversos municípios que têm em comum o drama de uma rodovia que mata pessoas e trava a economia – e que sucessivos governos federais, de Lula a Bolsonaro, não conseguem efetivar as obras de duplicação. E que tem em comum também a ausência de uma liderança que concentre esse eleitorado. Moisés olha para essa região e para esse eleitor.

Para isso, precisa ir além das promessas e fazer com que o gesto de usar dinheiro estadual em obra federal seja percebido por quem trafega pela BR-470. Os lotes 1 e 2, entre Navegantes e Gaspar, são suficientemente visíveis e concluíveis até a metade do ano que vem. Os lotes 3 e 4, entre Blumenau e Indaial, estão muito menos adiantados, mas diante da intenção do Ministério da Infraestrutura de utilizar nesse trecho parte dos recursos que o Estado ofertou e do impasse político que isso causou, especialmente pela ação do senador Jorginho Mello (Pl), que apontava “interesses não republicanos” da gestão Moisés, o governo teve que aumentar a aposta e separar mais R$ 100 milhões para atender aos quatro lotes. Moisés voltou da audiência pública no Senado com moral elevada junto ao PIB de Blumenau e região, peça importante da conquista do eleitorado local.

Com o caixa recheado, o governador tem apostado no asfalto e em obras pulverizadas – e cuidadosamente selecionadas em parceria com a ampla e tardia base aliada – para pavimentar seu projeto eleitoral. O discurso está pronto: o governo fez gestão, economizou recursos e agora consegue fazer essa economia virar obras e ações, inclusive as de responsabilidade de Brasília. Esse discurso tem uma cicatriz indelével e traduzível em uma pergunta: “onde estão os R$ 33 milhões?”

A desastrada operação de compra de 200 respiradores de UTI no início da pandemia derreteu a popularidade de Moisés em 2020 e quase serviu para que o próprio governo fosse fulminado em processos de impeachment. Como Moisés parece ser aquele tipo de pessoa que chega ao fundo do poço e encontra petróleo, ele não só conseguiu sobreviver à crise, como encontrou nela os elementos para reconstruir uma base de apoio em aliança com os antigos algozes. Mas a governabilidade, por si, não cura os efeitos negativos gerados pela compra dos respiradores fantasmas, o que faz sempre voltar a pergunta incômoda.

Por isso, é importante observar o movimento feito no início da semana, a parte reativa do discurso que balizará o Moisés candidato. Na segunda-feira, o Moisés governador lançou um site em que tenta mostrar que o governo não está alheio ao questionamento sobre o sumiço dos R$ 33 milhões pagos por 200 respiradores nunca entregues. Amalgamados, o governador e o candidato surgiram com a pose de quem não teme o assunto para dizer que 96,6% desses recursos estão bloqueados em dinheiro ou imóveis na fase de cobrança judicial. Que mantém ações para repatriar ao caixa do Estado esse montante e o que ainda não foi identificado. Que os 200 respiradores fantasmas não fizeram falta porque outros 526, reais, foram adquiridos.

As justificativas são importantes, mas a postura também. Quando o caso explodiu, em abril do ano passado, Moisés deu fim às lives diárias que fazia questão de conduzir naquele momento de crise pandêmica. Entocou-se na Casa d’Agronômica. Mesmo quando saiu, reorganizou o governo e iniciou o chamado novo momento da gestão, o tema sempre foi tratado de forma esquiva e – principalmente – com pouca indignação. A fala de segunda-feira e o site aberto para a população acompanhar passo a passo o resgate desses recursos é uma etapa importante nesse processo e que faltava. Punir os culpados é tarefa do Ministério Público de Santa Catarina e do Judiciário – o inquérito deve ser apresentado em breve. Recuperar o dinheiro perdido, é tarefa de Moisés.

Será suficiente para apagar junto ao eleitorado a pergunta incômoda? Provavelmente, não. Mas é o que o governador pode e deve fazer pelo candidato neste momento.


Sobre a foto em destaque:

Carlos Moisés lançou um site para responder questionamentos sobre a compra dos respiradores fantasmas. Foto: Ricardo Wolffenbüttel, Secom.  

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