Antes de mais nada, começo o texto dizendo que a frente de esquerda adiou mais uma vez a definição dos nomes da chapa que vai disputar as vagas de governador, vice e senador com apoio de oito partidos – Pt, Pdt, Psb, Pc do B, Pv, Psol, Rede e Solidariedade. Desta vez, garantem os dirigentes, é por apenas um dia: amanhã sai a confirmação do que todos já sabem: o ex-deputado federal Décio Lima (Pt) será o candidato a governador do grupo, referendado na convenção petista marcada para 25 de julho. Os demais nomes também serão anunciados, embora possam mudar: o vice é o ex-deputado estadual Gelson Merisio (Solidariedade), segundo colocado na disputa pelo governo em 2018, e o ex-deputado federal Jorge Boeira (Pdt) disputa o Senado.

Aí você pergunta: cadê Dário Berger e o Psb? Nesta quarta-feira, data marcada para a reunião decisiva da frente de esquerda, eles preferiram viajar a Brasília para bater uma foto com o ex-presidente Lula (Pt) e o ex-governador paulista Geraldo Alckmin (Psb), pré-candidatos a presidente e vice da República. Uma foto emblemática com os parlamentares que apoiam a dupla, postada nas redes do petista. A ausência do senador Dário Berger e do presidente estadual do Psb, Claudio Vignatti, também em Brasília, foi uma das justificativas para adiar novamente a definição da chapa, assim como uma questão pessoal do presidente estadual do Pdt, Manoel Dias.

Certo é que a chapa será apresentada com duas pontas soltas. A ida de Dário e Vignatti a Brasília atrás de Lula e Alckmin mostra que eles mantêm a disposição de tentar mudar os rumos da frente de esquerda a partir de Brasília. Por aqui, está tudo acertado em um grande acordo estadual entre Décio Lima, Gelson Merisio e Manoel Dias. Nessa composição, Merisio é coringa. Pode fazer, sem desgosto algum, o gesto de deixar a vaga de vice para que o Psb seja reacomodado – seja com Dário topando disputar a reeleição ao Senado, com Boeira remanejado para vice; seja com o próprio Psb ocupando o posto, com a vereadora Marcilei Vignatti ou o ex-vice-prefeito joinvilense Rodrigo Bornholdt.

O coringa Merisio também é um sinalização de que a frente pode seguir sem o Psb sem maiores traumas. O Psb andou batendo em algumas portas, de Gean Loureiro (União) a Carlos Moisés (Republicanos), sem muita perspectiva. Sem alianças, deve acabar compondo com a frente, mas vai espichar essa corda até onde der.

A outra ponta solta é o Psol, que mantém a pré-candidatura a senador de Afrânio Boppré, ex-deputado estadual e vereador em Florianópolis. Em nota, o partido voltou a criticar a possibilidade de que a vaga seja ofertada ao Pdt. A legenda diz que não faz sentido sete partidos que apoiam Lula terem um candidato majoritário que defenda o presidenciável Ciro Gomes (Pdt). Além disso, relembram o voto de Boeira, ainda no Progressistas, a favor do impeachment da presidente Dilma Roussef (Pt), em 2016.

É curioso como Pt, Psb e Psol reproduzem as disputas internas de um Pt de 15, 20 anos atrás. Décio Lima versus Claudio Vignatti, Afrânio Boppré contra alianças ao centro, etc. Todos foram petistas e já se bicaram. Continuam. Das memórias de repórter, trago uma de 2007. Entrevistamos o então governador Luiz Henrique da Silveira (Pmdb) no jornal A Notícia. Ele que havia sido eleito com apoio do Pt no segundo turno 2002, fora reeleito em 2006 em uma composição com o Pfl e o Psdb – a tríplice aliança. Luiz Henrique disse que não estava com o Pt por causa da “postura intransigente de um deputado do Pt que nem está mais no Pt”. Era Afrânio, líder da bancada do Pt na Alesc em 2003, responsável por vocalizar a contrariedade de boa parte dos petistas em participar de um governo que tinha já na época os tucanos em sua base. Em 2005, Afrânio deixou o Pt para formar o Psol em Santa Catarina.

Lembro que resolvemos repercutir aquela entrevista de LHS com a então senadora Ideli Salvatti, principal expressão do Pt catarinense à época. Para nossa surpresa, ela concordou com o governador: “sim, devíamos ter participado do governo e lutado internamente para mudar seu rumo”. Hoje é voz corrente entre lideranças petistas que não integrar o governo em LHS foi o maior erro da história do Pt catarinense – Décio Lima vive dizendo e até mesmo Lula, na entrevista que fizemos na Rádio Som Maior. Resgato a frase:

– O Pt teve muitos problemas internos, muita disputa política entre correntes políticas, o Pt muitas vezes se dividia pois (parte) queria apoiar o Luiz Henrique. O Pt devia ter feito parte do governo Luiz Henrique, não fez e foi um erro. Pagamos não pela competência dos adversários, mas por erros que cometemos.

E assim, após essas recordações, volto para este momento de quase definição de uma frente de esquerda que traz as marcas das velhas divisões do Pt. E que continua, como sempre, tendo como única expectativa eleitoral herdar os votos que Lula possa ter em Santa Catarina. Nesse ponto, eles todos se parecem muito com aqueles mandatários bolsonaristas que ficam disputando a tapa um passeio na garupa da moto do presidente Jair Bolsonaro (Pl).


Sobre a foto em destaque:

Dário trocou a reunião da frente de esquerda pelo canto direito da fotografia que Lula e Alckmin fizeram com parlamentares em Brasília. Foto: Ricardo Stuckert.

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