Está em gestação em Brasília uma mudança que é muito importante para os partidos e para as eleições do ano que vem. Para os eleitores, tenho minhas dúvidas. A Câmara dos Deputados aprovou na quarta-feira o requerimento para urgência na votação do projeto de lei que cria as federações partidárias – uma espécie de coligação que é feita pelas direções nacionais, vale para os Estados e municípios e precisa durar obrigatoriamente pelo menos quatro anos.
O que chama atenção na aprovação do requerimento e dá indicativo de que a regra pode valer já nas eleições de 2022 é a ampla margem de votos: 429 votos a 18. A proposta caminha à parte da cada vez mais babélica proposta de reforma política e com tramitação muito mais rápida, porque já passou pelo Senado.
Inicialmente, a proposta era vista como uma boia salva-vidas para pequenos partidos sobreviverem à cláusula de barreira e ao fim das coligações nas eleições proporcionais. Quem acompanha o que eu escrevo talvez lembre que chamei de “partidicídio” a expectativa de que com o fim das alianças para eleições de vereador e deputado houvesse uma ampla extinção de partidos por absoluta falta de voto para alcançarem sozinhos o quociente eleitoral. Sem coligação, cada legenda tem que montar chapa completa para buscar vagas nos parlamentos. Só os mais fortes sobreviveriam.
A cláusula de barreira aprovada em 2015 e aplicada pela primeira vez em 2018 também é um torniquete partidário. Ela estabeleceu pisos mínimos de votação nacional (para a Câmara dos Deputados) para que as legendas tivessem acesso a fundo eleitoral, tempo de televisão e espaços partidários no Congresso. Um percentual que aumenta a cada eleição e que em 2018 já deixou partidos tradicionais na berlinda: o PCdoB, por exemplo, teve que fundir com o antigo PPL para alcançar o percentual.
São justamente as lideranças do PCdoB que estão na linha de frente da defesa pública das federações partidárias. Elas permitiram ao partido integrar uma frente de partidos de esquerda sem ser engolido pelos maiores, mantendo alguma autonomia estatutária e operacional. O ex-presidente Lula (PT) é um dos que têm defendido a medida e usa os aliados comunistas como exemplo.
Mas como um lance de Ronaldinho Gaúcho (ou Mário Sérgio, para os mais antigos), a Câmara dos Deputados olha para a esquerda e manda a bola para o outro lado. Afinal, 429 parlamentares são um sinal eloquente de ampla adesão à proposta. A maior parte dos deputados federais foi eleita em coligação e as contas necessárias para renovar os mandatos têm assustado muita gente.
Aqui em Santa Catarina, por exemplo, apenas PSL, PT e Novo elegeram deputados federais em 2018 sem coligação. Ou seja, 10 das 16 cadeiras foram preenchidas por legendas coligadas. Isso porque houve a Onda Bolsonaro – em 2014, dois chapões partidários fizeram 14 das 16 vagas.
A diferença da antiga coligação para a federação é que se aprovado o novo modelo a relação é mais duradoura e seus efeitos valem para o país todo. Os partidos que se reunirem em federação terão que estar juntos por quatro anos – uma eleição nacional/estadual, uma municipal. Com tantos interesses locais, devem ser mais difíceis de fechar.
Mas algumas conversas estão em andamento. Uma delas teria impacto forte na eleição catarinense. DEM, PSD e Podemos estudam formar uma federação que reuniria, na prática, os herdeiros políticos do antigo PFL. Aqui no Estado, estariam obrigatoriamente juntos – pelo menos formalmente, os bondes de Raimundo Colombo, João Rodrigues, Júlio Garcia, Gean Loureiro, Paulo Bornhausen, entre outros tantos aliados e ex-aliados recorrentes. Pode sair daí uma forte chapa para a eleição de 2022. Se os federados falarem a mesma língua, claro.
Sobre a foto em destaque:
Presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), deve colocar a federação de partidos em pauta. Foto: Pablo Valadares, Câmara dos Deputados.