A Justiça Federal condenou a União a pagar R$ 70 mil de indenização por danos morais à família do ex-vereador de Botuverá José Bonus Leite Carroso, preso em abril de 1964 durante o início da ditadura militar. O Carroso, que era filiado ao Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) da época e chegou a ser presidente da Câmara do Município, faleceu em 2004, aos 79 anos, e teve a condição de anistiado político reconhecida em 2005, por portaria do Ministério da Justiça.
A sentença é da 2ª Vara Federal de Itajaí e foi proferida em 23/7 pela juíza Vera Lúcia Feil, em ação proposta pela viúva, seis filhos e uma neta do anistiado, esta descendente de outra filha, falecida em 2000.
– Neste momento, em que ressurgem vozes em tons nostálgicos em relação ao período ditatorial, inclusive em tentativas de revisar e alterar os fatos históricos e em glorificação ou mitigação das violências praticadas, torna-se ainda mais importante que ao menos a fixação da compensação monetária às vítimas políticas da ditadura sirva como um lembrete, um alerta de que o que se fez foi grave e injusto e não deve se repetir – disse a juíza.
De acordo com o relato à Justiça, a família teve a casa invadida em 10 de abril, quando o vereador foi preso e levado à Delegacia de Polícia do município vizinho de Brusque. Ele teria sido interrogado sobre a atuação política, a criação da Cooperativa de Eletrificação Rural e a Fundação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Durante os interrogatórios, ele teria sido coagido a renunciar ao mandato e denunciar o então vice-governador do Estado, que também era filiado ao PTB e foi cassado em 1966.
A própria União teria reconhecido a prática de atos arbitrários contra o Carroso, “considerando que lhe concedeu o direito de anistia política”. Os documentos juntados, segundo a sentença, revelam que o parlamentar foi detido em abril de 1964 por agentes do regime militar, no município de Brusque, tendo, inclusive, sofrido maus tratos e tortura na prisão, sendo solto apenas em novembro de 1964.
O processo relata que “dias após a prisão, em virtude da absoluta falta de comida e água, precisou ser carregado por policiais até a sala de inquirição, pois não reunia forças para subir as escadas. Durante as sessões de interrogatório, o Sr. José Bonus Leite Carroso era constantemente coagido a renunciar seu mandato de vereador e a denunciar o vice-governador do Estado de SC, Dr. Francisco Dall’Igna – filiado ao mesmo partido (PTB) –, sob várias ameaças à sua família e à sua integridade física. Enquanto isso, a família seguiu por dias sem notícias do seu paradeiro até que, com a ajuda de amigos, a Primeira Autora foi informada do local do cárcere em que se encontrava seu marido. Grávida, aos oito meses de gestação, a Primeira Autora suplicou ao delegado para ver seu marido. Contudo, a autoridade policial manteve-se irredutível”.
– Os danos advindos do indiciamento em inquérito policial militar, da prisão política, atos todos arbitrários, são evidentes, pois, além da dor que se espalha no âmbito subjetivo, o fato de ser perseguido político naquela época chamava a atenção das pessoas, da vizinhança, que consideravam a família toda do preso como ‘subversiva’ e ‘contra o Governo’. Isso fazia com que fosse discriminada, humilhada e passasse por uma reprovação social constante; não há dúvidas de que isso causa sofrimento e constrangimentos – observou Vera.
O vereador foi liberado com a troca de chefia da delegacia, assumida por outro militar. Ele e a família sofreram perseguição por parte da sociedade civil por conta da prisão – por receio desta se envolver com presos políticos e, com isso, passaram por dificuldades financeiras.
– Essa situação foi reconhecida na Constituição Federal de 1988, oportunidade em que os direitos fundamentais ganharam posição topográfica de destaque, com predominância sobre o Estado, assegurando-se no capítulo dos direitos fundamentais, a dignidade da pessoa, reparando, ao menos juridicamente, o sofrimento imposto.
Cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre.
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