Qual é o tamanho da direita não bolsonarista e da esquerda não lulista, incluídos os 50 tons de centro que existem entre uma posição e outra? As ruas deram essa dimensão na tarde de domingo, com as manifestações convocadas pelo Movimento Brasil Livre (MbL) e pelo Vem Pra Rua, inicialmente com a tese do “nem Bolsonaro e nem Lula” e depois suavizada em uma tentativa de frente ampla contra o atual inquilino do Palácio do Planalto. O chamado foi atendido por 6 mil pessoas na Avenida Paulista, em São Paulo. Em Florianópolis, foram 500.

Os números são extremamente tímidos se comparados aos milhares de bolsonaristas que saíram às ruas no dia 7 de setembro – pelas estimativas das polícias militares, 150 mil pessoas em Brasília e 120 mil em São Paulo. Em Florianópolis teriam sido 50 mil os apoiadores do presidente na Avenida Beira-mar Norte naquela tarde, segundo os organizadores. Os números, no entanto, também são tímidos se comparados aos protestos da esquerda lulista naquela mesma data – 35 mil em São Paulo – e os eventos anti-Bolsonaro realizados em outros momentos, inclusive na capital catarinense. Principais partidos de esquerda de Florianópolis, o Psol e o Pt haviam decidido seguir a orientação nacional de não integrar os atos.

Como publiquei sábado, a sorte de quem quer uma terceira via, seja qual for, é que a eleição não é hoje. Nem ontem. Por mais que haja tempo para construção de uma alternativa ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e ao ex-presidente Lula (Pt) e que as pesquisas identifiquem uma demanda por isso no eleitorado, essa tese ainda não mobiliza, não engaja, não tira pessoas de casa. Olhando para a manifestação de ontem em Florianópolis, percebe-se que se os jovens militantes da pré-candidatura de Ciro Gomes (Pdt) não tivessem comparecido, a foto ficaria bem mais acanhada do que já ficou.

No entanto, a política não se faz apenas com militantes, mas também com lideranças de peso político. Na Paulista, o evento reuniu quatro presidenciáveis: Ciro Gomes, o governador João Dória (Psdb) e os senadores Alessandro Vieira (Cidadania de Sergipe) e Simone Tebet (Mdb do Mato Grosso do Sul). O palco também recebeu deputados federais de diversos partidos, o que deu peso político ao evento. É importante, mesmo que eles ainda sejam chamarizes de público.

Em Florianópolis, uma espiadela mostra que liderança com voto, por ali, tinha apenas a vereadora Manu Vieira (Novo). É curioso isso, porque boa parte dos pré-candidatos ao governo de Santa Catarina postula abrigo em um palanque local dessa construção “nem Bolsonaro e nem Lula”. Façamos um exercício lúdico aqui – para aproveitar a expressão que o nosso chargista Galvão trouxe no final da semana – e imaginemos quais lideranças políticas do Estado poderiam estar na escadaria da Catedral de Florianópolis se estivessem aliando o discurso à prática:

1) O ex-governador Raimundo Colombo (Psd).

Sim, o lageano se recusou a aderir à Onda Bolsonaro em 2018 e faz um discurso crítico ao presidente desde o primeiro dia de mandato. Está alinhado a Gilberto Kassab (Psd), um dos articuladores nacional da terceira via. Poderia estar no palanque.

2) O prefeito florianopolitano Gean Loureiro (Democratas).

Ele não critica Bolsonaro com todas as letras, mas é um dos nomes naturais do “nem esquerda, nem direita” e também está alinhado a essa construção nacional. Sua reeleição em Florianópolis, ano passado, foi um laboratório de como conseguir se blindar do bolsonarismo sem endossá-lo.

3) O ex-deputado estadual Gelson Merisio (Psdb).

Segundo colocado ao governo em 2018, o ex-pessedista anunciou apoio a Bolsonaro em 2018 ainda no primeiro turno e foi derrotado por quem se declarava “verdadeiro candidato do Bolsonaro”. Depois da derrota, buscou abrigo no ninho tucano e apoia o governador gaúcho Eduardo Leite na prévia do Psdb – e o presidenciável estava na manifestação de Porto Alegre.

4) O senador Dário Berger (Mdb).

Crítico ao governo federal, alinhado à presidenciável Simone Tebet e visto como ponte eventual entre o Mdb e a centro-esquerda, também poderia estar lá.

Esses quatro nomes trariam gente com eles se estivessem no palanque? Dificilmente. Sairiam desgastados precocemente junto ao majoritariamente bolsonarista eleitor catarinense? Certamente. Foram convidados pelo Mbl e pelo Vem Pra Rua, dois movimentos que nasceram da repulsa à politica tradicional? Não faço ideia.

Uma coisa, no entanto, é bastante previsível. Se as coisas estão difíceis para uma terceira via nacional, em Santa Catarina ela deve sofrer ainda mais.


Sobre a foto em destaque:

Manifestação contra Bolsonaro em Florianópolis reuniu cerca de 500 pessoas em frente à Catedral. Foto: Pdt-Florianópolis, Divulgação.

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