Poucos sabem, mas no começo da minha carreira como jornalista, lá em 2006, passei uns dois meses acompanhando campeonatos de surfe trabalhando no antigo AN Capital, de Florianópolis. Eu sabia praticamente nada sobre o esporte quando a responsabilidade me foi dada e só consegui escrever os textos com alguma segurança graças às dicas do querido colega fotógrafo Ricardo Mega e depois de acompanhar três ou quatro campeonatos com o pé na areia. O mais importante que aprendi: é mais difícil do que parece.

Com o pé na areia da praia alargada de Balneário Camboriú, no sábado, os aliados catarinenses do presidente Jair Bolsonaro (Pl) também devem ter percebido que ele é uma onda difícil de surfar.

O evento era praticamente impossível de dar errado. Balneário Camboriú é um dos epicentros do bolsonarismo no Estado mais bolsonarista do país. O evento, a Marcha para Jesus, reúne um dos públicos mais ardorosos do presidente – os evangélicos. Uma conjugação que fez os organizadores prometerem um público de 50 mil pessoas para prestigiarem Bolsonaro após uma semana difícil, com foco político marcado na operação da Polícia Federal que prendeu o ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, e os indícios captados no telefonema entre ele e a filha de que o presidente o alertara sobre a possibilidade de que sofresse um mandado de busca e apreensão.

Segundo a Polícia Militar, Bolsonaro recebeu metade do público prometido: 25 mil pessoas. Há quem diga que foi menos, como a colega Dagmara Spautz. Ninguém disse que foi mais. Não vou entrar no debate sobre se o evento foi bom ou ruim em termos de público enquanto os adversários do presidente não colocarem pessoas na rua também. Foi aquém, parece óbvio, do que o próprio Bolsonaro já mobilizou em Santa Catarina. A mobilização que ele pode gerar entre os catarinense reflete diretamente no tamanho da onda eleitoral que os aliados de Bolsonaro no Estado podem surfar. É isso que pode começar a preocupar o pré-candidato a governador Jorginho Mello (Pl), o pré-candidato a senador Jorge Seif e a dezena de pré-candidatos a outros cargos que tentou surfar Bolsonaro no sábado e acabou tomando caixote.

Bolsonaro não deixou nenhum pré-candidato tomar a linha de frente, ombrear com ele. Deu a mão apenas ao empresário Luciano Hang, das Lojas Havan, fora da disputa desde março. Ainda na areia, Seif deixa o grupo que está atrás do presidente em busca de sua mão. É cortado e volta acabrunhado para a linha de trás. Durante o domingo, a cena tornou-se uma daquelas polêmicas ridículas: a quem Bolsonaro rejeitou a mão? A Seif ou a vice-governadora Daniela Reinehr, que estava logo atrás? Deixo a imagem aí, que é clara, mas é de se pensar se alguma vez na história de Santa Catarina um gabinete de vice-governador lançou nota oficial para dizer que um “chega para lá” presidencial foi para outra pessoa – um colega de partido, aliás.

Bolsonaro nega a mão a Jorge Seif:

Outro vídeo mostra outra tentativa desastrada de surfar Bolsonaro. No carrinho em que o presidente e a primeira-dama eram transportados entre os apoiadores pela areia da praia de Balneário Camboriú, o senador Jorginho Mello faz uma manobra ousada em busca de um 10 dos jurados. Deixou a parte de baixo do carrinho, onde estava confortavelmente sentado, e tentou subir para junto de Bolsonaro. Foi se aproximado, se aprochegando, se imiscuindo. Até ser barrado por Mauro Cid, o chefe dos ajudantes de ordens do presidente. Jorginho continuou a pé junto ao carrinho durante o caminho. Que se veja esse tipo de cena envolvendo neófitos como Seif e Daniela, até já nos acostumamos. Mas de um senador da República, duas vezes deputado federal e quatro vezes deputado estadual, é daquelas coisas que a ciência política um dia há de responder.

Jorginho é vetado no carrinho de Bolsonaro:

Sem muito talento para o surfe eleitoral, o casal Esperidião e Angela Amin foi receber Bolsonaro no aeroporto e esperou pelo presidente no palco. Nem isso garantiu a tranquilidade. O senador, que pretende concorrer ao governo, teve o nome vaiado pelo público presente – um misto de evangélicos, bolsonaristas do Pl e bolsonaristas de outras matizes. Não vai ser fácil, mesmo discretamente, beneficiar-se dessa onda (Correção: Amin e Angela acompanharam a caminhada pela areia e não subiram ao palco. A vaia aconteceu quando o nome de Amin foi citado no palco, mesmo ausente).

No palanque, Bolsonaro repetiu o que vem dizendo em todos os espaços. Apresentou a disputa contra o ex-presidente Lula (Pt) como uma luta do bem contra o mal, defendeu armas, condenou abortos, disse ter um exército de 200 milhões de pessoas. Voltou a falar que só aceita o jogo dentro das “quatro linhas da Constituição”, mais uma vez sem dizer que versão é essa da Constituição Federal que só tem quatro linhas.


Sobre a foto em destaque:

Jorge Seif e Jorginho Mello tiveram dificuldades para surfar a onda Bolsonaro em Balneário Camboriú. Foto: Alan Santos, Presidência da República.

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