Quatro anos atrás, a maioria esmagadora do eleitorado catarinense utilizou o número do partido do candidato Jair Bolsonaro na época, o 17, para mudar o jogo político do Estado. Um desconhecido foi alçado ao governo, outros tão desconhecidos quanto viraram deputados federais e estaduais. O catarinense aparentemente disse que preferia desconhecidos aos mesmos de sempre – ainda que com rostos diferentes. O bombeiro militar Carlos Moisés virou governador e não seguiu literalmente a cartilha do presidente, achou que tinha margem para fazer as coisas do seu modo.

Quatro anos se passaram e, neste domingo, o eleitor catarinense dobrou a aposta. O novo número de legenda de Bolsonaro, agora o 22, serviu para dar mais um golpe muito forte em dois alvos bem definidos: a tradição política catarinense e aqueles que foram eleitos para ser e parecer bolsonaristas, mas ousaram trilhar caminho próprio. Jair Bolsonaro recebeu 62,2% dos votos válidos em Santa Catarina, percentual praticamente idêntico aos 65,8% que teve na eleição de 2018. Em números absolutos, a persistência do apoio incondicional ao presidente impressiona: Bolsonaro ganhou 90 mil votos no Estado, passando de 2,6 milhões para 2,69 milhões.

Nestes quatro anos, o eleitor assistiu Moisés permanecer no Psl quando o presidente abandonou o partido. Depois viu o governador buscar apoio dos tradicionais Mdb, Psdb, Psd e dos emergentes Podemos e Republicanos quando precisou se salvar das crises políticas que enfrentou durante a pandemia. Deixou o Psl, flertou com vários e casou com o Republicanos. Enquanto isso, Bolsonaro escolhia em Brasília seu novo partido, seu novo número, indiferente às questões catarinenses. Definiu-se pelo Partido Liberal (Pl), que já esboçava por aqui um projeto político estadual com a pré-candidatura de Jorginho Mello ao governo.

Assim, o Pl teve a chance e sorte de somar uma construção feita no tempo à adesão de lideranças do bolsonarismo – algumas delas fruto da Onda 17 da qual Moisés desgarrou. Aos olhos da política tradicional – e de certo jeito tradicional de se ler a política – era um condomínio de interesses diversos, cheio de rivalidades internas, tendo como base um partido com uma quantidade pouco relevante de prefeitos nas 295 cidades catarinenses. Enquanto isso, Moisés amealhava apoios formais e informais de prefeituras, Gean Loureiro construía sua candidatura com um olho no tempo de televisão e outro no abraço bolsonaro-oestino de João Rodrigues e Esperidião Amin acreditava piamente que poderia ser ele o bolsonarista da vez se usasse as palavras certas na campanha eleitoral.

A resposta do eleitor a todos esses movimentos foi reforçar um entendimento que já lhe era claro em 2018: bolsonarista é quem está no partido de Jair Bolsonaro. O movimento colocou Jorginho disparado em primeiro lugar e favorito para o segundo turno contra o petista Décio Lima. Colocou o desconhecido Jorge Seif como Senado com a mesma facilidade que transformou Moisés em governador quatro anos antes. Dizimou a bancada federal que votou de graça todos os temas que Bolsonaro e o bolsonarismo quiseram nesta legislatura – de que serviu a fidelidade canina de Darci de Matos, Rodrigo Coelho, Hélio Costa, Geovânia de Sá e Angela Amin em partidos cujas legendas não começavam com 22?

O catarinense mostrou que está com Bolsonaro quase que incondicionalmente e sem espaço para nuances. Para quem trabalha com jornalismo político fica a estranha constatação de que tanto foi dito e analisado nestes últimos meses, mas a verdade é que a eleição de Santa Catarina foi decidida quando Valdemar da Costa Neto levou a melhor sobre Ciro Nogueira e convenceu Bolsonaro a escolher o 22 em vez do 11.


Sobre a foto em destaque:

Bolsonaro fez campanha em Joinville no sábado, véspera da eleição, e ajudou a impulsionar ainda mais a chapa Jorginho/Marilisa ao governo e Jorge Seif ao Senado. Foto: Eduardo Valente, Divulgação.

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