Dois mandatos de deputado federal e um de senador colocaram Jaison Tupy Barreto nas páginas da história política catarinense como um hábil tribuno que usou seus discursos no combate ao regime militar entre 1971 e 1986. Sua trajetória, no entanto, ficou vinculada a uma derrota daquelas que marcam – não só um político, mas um partido e um Estado. Em 1982, na eleição direta para governador após um hiato de 17 anos, Jaison Barreto (Pmdb) foi derrotado por Esperidião Amin (Pds) por 12.650 votos.
Vivendo o auge político na metade do mandato de senador conquistado em 1978, Jaison foi o primeiro candidato do Pmdb ao governo do Estado. Havia vencido na prévia do partido o deputado federal e ex-prefeito de Joinville Pedro Ivo Campos, que disputaria o Senado contra o ex-governador Jorge Bornhausen (Pds). Foi uma eleição marcada por uma disputa entre a onda de renovação pela retomada das eleições diretas após três governadores escolhidos a dedo pelo regime militar, sob a bênção do temido Serviço Nacional de Informações (Sni), contra a organização das maiores máquinas políticas do Estado em torno de um nome novo: Amin aos 34 anos.
Foi uma eleição também marcada por denúncias de uso da máquina governista e de fraudes eleitorais – a fragilidade da votação em papel gerou histórias que até hoje estão no anedotário político. Ao assumir o governo com a renúncia de Bornhausen para ser candidato, o vice Henrique Córdova (Pds) chegou a dizer em entrevista ao jornal O Estado que não se comportaria como um magistrado naquela eleição. O uso do Besc naquele disputa e a até a epidemia de aposentadorias por invalidez na Assembleia Legislativa ajudam a contar essa história sobre poderes que não se comportam.

Jaison Barreto vota em 1982. Faltaram 12.650 votos para que se elegesse governador no retorno das eleições diretas.
Como disse, Jaison perdeu para Amin por 12.650 mil votos. Ao Senado, Pedro Ivo perdeu para Bornhausen por uma diferença ainda mais irrisória: 1.439 votos. As trajetórias de todos os personagens mudaram muito a partir desse ponto. O jovem Amin consolidou sua liderança no comando do Estado, especialmente nas campanhas de reconstrução após as enchentes histórias das anos 1980. Bornhausen mostrou no Senado as qualidades de articulador político que fizeram dele peça fundamental para a formação da dissidência do Pds que ajudou a eleger a chapa de civis Tancredo Neves/José Sarney na última eleição indireta para presidente da República, em 1985. Pedro Ivo seria eleito governador de Santa Catarina em 1986, a primeira vitória do Pmdb no Estado, mas morreria antes do fim do mandato. A derrota em 1982 deu fôlego a grupos mais centristas dentro do Mdb catarinense, como o próprio Pedro Ivo. Foi esse o perfil mais pragmático que levou o partido ao poder e que teria seu ápice nos anos de Luiz Henrique da Silveira.
Jaison nunca mais se elegeu. Convidado por Leonel Brizola, Jaison migrou para o Pdt – onde se esperava uma guinada à esquerda. A surpresa, no entanto, foi a aproximação com aquele que o derrotara três anos antes. Em 1985, o Pdt de Jaison e o Pds de Amin estavam juntos na eleição para prefeitura de Florianópolis. A chamada Aliança Social Trabalhista não fez sucesso nas urnas, que elegeriam o peemedebista Edison Andrino, e foi desfeita. No ano seguinte, tentou retornar à Câmara dos Deputados, mas ficou longe da vaga – teve 23 mil votos e Pdt não alcançou a legenda. Por diferenças com Manoel Dias, acabou deixando o partido e migrando para o Psdb. Não chegou a disputar eleições e se afastou da sigla nos anos 1990.
Desde então, Jaison ocupou-se do papel de crítico da política, dos partidos, da esquerda. Era bom ouvi-lo – e tive esse privilégio algumas vezes. Com sua morte neste domingo, aos 88 anos, perde-se uma memória invejável e uma fala cheia de dignidade que nem as contradições de sua trajetória política esmoreciam. O que teria acontecido com Santa Catarina, com o Pmdb e com o próprio Jaison não fossem aqueles 12.650 que faltaram em 1982, nunca saberemos. Mas será sempre bom imaginar.
Sobre a foto em destaque:
Jaison Barreto, ainda senador, discursa em comício pelas Diretas Já ao lado de Ulysses Guimarães e Esperidião Amin, que o derrotara na disputa pelo governo. Ambos se tornariam amigos. Foto: James Tavares.
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