Ao final do debate da Rádio Som Maior que reuniu sete candidatos a governador na manhã desta segunda-feira, uma constatação pode ser feita: não há intrusos na conversa. Todos os nomes reunidos na mesa tinham credenciais, currículo e discurso para pleitear o governo do Estado. Conversa de gente grande. Com Carlos Moisés (Republicanos), Décio Lima (Pt), Gean Loureiro (União), Esperidião Amin (Progressistas), Jorge Boeira (Pdt), Jorginho Mello (Partido Liberal) e Odair Tramontin (Novo), Santa Catarina terá uma eleição com diversidade de vozes, estilos e projetos que talvez ainda não tenha visto em sua história político-eleitoral.
Veja a íntegra do debate na Rádio Som Maior:
Isso porque a era das megacoligações, entre 1998 e 2018, ajudou a mutilar as vozes. Diversas pré-candidaturas acabaram cedendo e ficando pela estrada ao longo daqueles 20 anos ao pragmatismo da adesão ao maior comboio partidário – da Mais SC de Esperidião Amin em 1998 à tríplice aliança de Luiz Henrique e Raimundo Colombo em 2006 e 2010 e suas derivadas nas eleições seguintes. Desta vez, as composições são menores, mais equilibradas e há mais competitividade no ar. Não há partidos nanicos, não há gente em busca de mera visibilidade – e nem tumultuadores de debate.

Candidatos do 22 e do 13, símbolos no Estado da polarização nacional, Jorginho e Décio mostraram camaradagem nos intervalos.
Por si só, essa é uma vitória da democracia. O cardápio oferecido ao eleitor está mais amplo e mais sofisticado. Os debates realizados pela SCC no sábado e pela Som Maior nesta segunda são um aperitivo desse quadro inédito de múltiplas candidaturas. Ainda em aquecimento, os candidatos testam suas narrativas e tentam uma ou outra estocada nos adversários preferenciais. Nos primeiros debates, mais importante que a suposta vitória no enfrentamento é não sair derrotado. Nesse quesito, estão todos incólumes até agora.
O que não significa que não haja destaques neste primeiro momento. O governador Carlos Moisés, com as ações da máquina estadual controla hoje, e o senador Esperidião Amin, duas vezes ex-governador, mostram forte domínio dos assuntos que colocam na mesa. Moisés tem um governo para defender e para pedir continuidade. Amin, o mais experiente, traz uma narrativa própria em que fala mais sobre o futuro e opções aos jovens do que seus concorrentes. A defesa que faz das ações do governo Jair Bolsonaro (Partido Liberal) não é o ponto central de sua narrativa, como muitos esperavam. O ponto centro é Amin, sempre será.
Gean Loureiro também sai do debate com motivos para sorrir. Vive pela primeira vez o desafio de se apresentar ao eleitorado em eleição majoritária – quando concorreu a prefeito de Florianópolis pela primeira vez já era uma figura conhecida na Capital, pelo cinco mandatos como vereador com marketing ostensivo. Embora mostrasse certo nervosismo em alguns momentos, conseguiu pautar temas da gestão como prefeito para fazer contraponto ao governo Moisés e à experiência de Amin.
Jorginho Mello, colado em Bolsonaro, vive seus primeiros debates como protagonista e ainda procura achar o discurso. Acerta quando adota o tom provocativo – especialmente nos confrontos com Moisés e Gean. Ao primeiro, acusa de ter abandonado o presidente a quem deve a primeira eleição. Ao segundo, tenta colar a pecha de ter exagerado na conta das restrições impostas à sociedade no combate à pandemia. Citou nos dois debates a viagem a Cancún feita por Gean durante esse período. É uma forma de alinhamento ao eleitor bolsonarista – avesso a Moisés e crítico do “fique em casa” na pandemia.
Como franco atirador, Odair Tramontin também está aprendendo a lógica dos debates. Tem postura e fala firme em questões de apelo popular, como as críticas do Fundo Eleitoral – que o Novo abre mão. Confrontou Moisés, a quem tenta substituir como opção fora da política catarinense, e foi o único a polarizar com Décio Lima, assumindo sozinho a bandeira do antipetismo. Mas acabou entregando um direito de reposta de bandeja ao petista por chamar de “mentira” um debate sobre o caráter público ou privado do Hospital Santo Antônio, em Blumenau. Alguém mais escolado em debates eleitorais teria dito que o petista “faltou com a verdade” e escapado de dar tempo extra ao adversário. Da mesma forma, ironizou a fala de Moisés sobre a lista de obras previstas ou executadas em seu mandato para o Sul do Estado dizendo que “Moisés já fez tudo”. O governador agradeceu.
Na raia da esquerda, Décio Lima usou a abusou do ex-presidente Lula, candidato do partido ao Planalto. A proximidade com o presidente e ser o único candidato do líder petista faz com que o ex-deputado federal busque ser o nome exclusivo dessa fatia do eleitorado. Parece uma eleição à parte. Na defesa do legado petista em Santa Catarina, chegou a responder a Jorge Boeira que a duplicação da BR-470 não foi concretizada nas gestões do partido por causa do impeachment de Dilma Rousseff em 2016 – Gean e Tramontin não seguraram o riso nessa hora.

Gean Loureiro e o marqueteiro Fábio Veiga conversam em um dos intervalos.
Também estreante em debates majoritárias, Boeira demorou um pouco a encontrar o tom e pareceu nervoso no início, mas também se soltou. Foca em temas de educação e se aventura na infraestrutura – onde tentou polarizar com Moisés. Em alguns momentos – tanto hoje quanto sábado – exagerou nas tabelinhas de temas positivas com Amin. Ambos eram colegas de Progressistas até o final de 2021 e, às vezes, pareciam continuar sendo.
Mas e o confronto? Embora ainda estejam se estudando e poupando munição, o debate desta segunda-feira mostrou algumas farpas interessantes. Além das citações à viagem de Gean a Cancún na pandemia, Jorginho criticou Moisés pelo uso do avião oficial para uma viagem pessoal a Bonito, no Mato Grosso do Sul. O governador se esquivou e só respondeu o tema, timidamente, quando Tramontin voltou ao assunto. Moisés disse que vendeu o avião exclusivo do governador e agora compartilha uma aeronave com o Corpo de Bombeiros – e que não deixa de ser governador quando está fora de serviço. Ou seja, Moisés ainda não achou uma boa resposta para o assunto.

Jorge Boeira conversa com a assessoria no intervalo.
As maiores alfinetadas, no entanto, vieram no confronto de Moisés e Gean. O ex-prefeito de Florianópolis logo na primeira fala criticou a gestão da saúde na pandemia e pela recente falta de Utis pediátricas. Disse que o governador devia pedir desculpas em vez de participar de debate em horário de expediente e prometeu que trabalharia dia e noite para resolver os problemas do Estado. Na resposta, forte, Moisés sugeriu aos ouvintes pesquisar “Gean Loureiro escândalo” no Google para saber “como Gean Loureiro governa”. Para essa pesquisa, o Google apresenta como primeiros resultados o episódio em que o ex-prefeito foi filmado fazendo sexo com uma funcionária comissionada em um gabinete da prefeitura da Capital. A resposta de Gean foi que nenhum catarinense precisa ir ao Google para saber qual o maior escândalo do governo Moisés: a compra dos respiradores fantasmas por R$ 33 milhões.
O jogo começou. Bem-vindos ao jogo.
Sobre as fotos em destaque:
Lucas Sabino, Som Maior.