Muito próxima do momento de decisão sobre o seu futuro partidário, a deputada estadual Paulinha (ex-Pdt) deu uma demonstração de força política no sábado, ao reunir mais de 700 lideranças, entre prefeitos, vice-prefeitos, vereadores, suplentes, secretários municipais, representantes empresariais e comunitários – além do governador Carlos Moisés (ex-Psl), que encerrou o evento com uma palestra. O encontro – chamado #juntosporSC – foi realizado em Canelinha e mostrou o alinhamento total com o governo do Estado e o projeto de reeleição de Moisés. Além, é claro, de evidenciar a capacidade de mobilização da ex-pededista.

Antes do encontro, durante a semana, Paulinha me recebeu em seu gabinete na Assembleia Legislativa para falar de seu futuro político. O passado, de certa forma, continua por lá representado pelo quadro de Leonel Brizola e por um retrato com o presidente estadual do Pdt, Manoel Dias. Ela diz que a expulsão do Pdt é parte do passado, mas que não vai tirar o quadro e o retrato do gabinete. Paulinha acredita que sua expulsão – por ter aceitado ser líder do governo Moisés na Assembleia Legislativa – aconteceu por um motivo anterior: em sua eleição para deputada estadual em 2018, ela recebeu mais do que o dobro de votos de Manoel Dias, candidato único do partido a deputado federal.

– Depois disso, pela primeira vez na vida o Manoel ficou duas semanas sem falar comigo –  conta.

O futuro, neste momento, aponta para o Cidadania. Ela vem mantendo conversas com lideranças do partido, embora haja pontos a acertar. Na mesa também estão duas siglas de porte: Psd e Mdb, nesta ordem. Em comum, são três partidos que ainda não é possível apostar se estarão no projeto de reeleição de Moisés, condição importante para ela.

Leia a íntegra da entrevista:

Deputada Paulinha, tem três perguntas na política que todo mundo me faz: para qual partido vai o presidente Jair Bolsonaro, para qual partido vai o governador Carlos Moisés e para qual partido vai a Paulinha? Já que estou na sua frente, para qual partido vai a Paulinha?

Então, querido, a gente deve definir nesses próximos dias. Sábado, dia 23, a gente vai promover um encontro de líderes e essa vai ser a mais importante consulta. Eu recebo vereadores, prefeitos das mais diversas regiões que me acompanham no mandato. E a gente começa a destrinchar esse caminho. Eu já começo também a ficar ansiosa, muitos amigos dizem que não preciso ter pressa e devo esperar até março, mas o meu coração pulsante precisa de um lugar pra chamar de seu.

Dia 23, número do Cidadania, é um partido que se diz nos bastidores que poderia ser uma das opções. É o Cidadania?

É uma opção, não é uma decisão. A data do dia 23 foi a coisa mais engraçada porque esse encontro está marcado há muitos meses já. A gente olhou no calendário e esse era o sábado mais apetitoso para ajeitar a agenda. A gente deve receber lideranças do Cidadania também nesse dia, mas do Mdb, do Psd, do Pp, de diversos partidos.

Não lhe preocupa escolher um partido do porte do Cidadania, que embora tenha uma deputada federal em Santa Catarina, é meio acanhado, e ter que fazer a legenda praticamente sozinha?

Preocupa porque a construção é muito mais ardida nesse cenário, mas é o que eu volto a dizer, uma decisão de envergadura não pode ser tomada apenas por nossos próprios instintos.

A gente precisa sentar com uma conselharia, com o próprio pessoal do Cidadania e ver as condições que se tem para construir uma chapa que permita a eleição de mais gente além de mim. Eu não me vejo construindo um projeto exclusivo para o meu Cpf, isso não funciona pra mim. E, por isso, essa conversa precisa ser muito bem medida para que se possa tomar uma decisão.

Esse partido em que a senhora estiver, ele precisa estar alinhado ao projeto de reeleição do governador Moisés?

É decisivo para mim. Eu acabei de ser expulsa, estou dentro do parlamento dona de um voto só. Depois de 32 anos de história, eu não quero passar por outro desconforto nos próximos anos. O nosso mandato tem uma vinculação muito importante não só com a figura do governador. A gente se fala muito menos do que eu acho que deveria, pelas oportunidades, o trabalho é intenso. Há uma vinculação de projetos, eu gosto dessa ideia de ter um governo mais enxuto, com mais sobras de recursos, dispondo de mais condições para as pequenas cidades, principalmente. A gente vive um momento único em Santa Catarina, sem demérito a nenhuma das grandes construções que foram feitas por governos passados, é relevante que se faça essa menção. A verdade é que o governo Moisés nos traz uma condição ética que permite que mais recursos cheguem para as cidades, em especial as pequenas.

O que significa essa “condição ética”? Estão metendo menos a mão no baleiro?

Acredito que sim. Para ser direta ao ponto, eu acredito que tem menos oportunidades, não só pela figura do Moisés, mas pelas condições hoje. As pessoas têm mais acesso à informação, os órgãos de controle estão mais rígidos. O sistema de controle do recurso público funciona melhor e o Estado comprou essa ideia. Reduzir mais de 2 mil cargos em comissão foi uma decisão difícil, extinguir as Adrs (agência de desenvolvimento regional) foi uma decisão difícil. São pessoas que viviam de um emprego e que agora não têm mais essa possibilidade. Você corta vínculos e começa a construir uma nova história. Quando você faz um novo processo licitatório e tem, nos contratos vencidos nessa renovação, uma economia de mais de R$ 300 milhões, isso é significativo. A gente tá falando de recurso efetivo que permite reposição salarial, condições melhores no serviço público, nos atendimentos aos hospitais. Essa distribuição de recursos que chega ao ponto de ofertar R$ 470 milhões para obras federais. Muita gente contestou nosso apoio a ela, mas não é uma questão de oportunismo. É uma questão de lógica. Quem passa pela rodovia é o catarinense, não importa se ela é municipal, estadual ou federal. As vidas que ali ficam ou os negócios que deixam de ser empreendidos pela impossibilidade de deslocamento, quem sofre somos todos nós.

Paulinha quer um partido que se alinhe à reeleição de Carlos Moisés, que participou do encontro de lideranças realizado por ela em Canelinha. Foto: Divulgação.

Além da questão da economia, que é tão falada e existem exemplos que comprovam, Santa Catarina também surfa um momento arrecadatório baseado na inflação. A inflação dos combustíveis, a inflação na energia elétrica. Não tem um certo temor de que Santa Catarina esteja esbanjando algo que não é permanente?

Não sei se “esbanjar” é a palavra mais correta. Eu sempre digo que governo não é banco, que guarda dinheiro é banco. Governo precisa pegar seu capital e toda sua capacidade de empréstimo e aplicar em benefício de sua população. Enquanto tiver demanda, elas precisam ser honradas e suprimidas no menor tempo possível. A gente tem um déficit na saúde pública catarinense gigantesco, de muitos anos e muitos anos que os investimentos não foram feitos devidamente. E é nisso que a gente tem que se concentrar. Obras de infraestrutura, é cientificamente comprovado, elas geram resultado econômico pro Estado. Você aplica, mas retorna aos cofres públicos com mais progresso.

Voltando à questão do Cidadania, hoje esse partido tem a liderança da deputada federal Carmen Zanotto, que não tem uma boa relação com o governo Moisés. Certamente se ela permanecer no Cidadania, é uma dificuldade. A senhora conta com a saída dela do partido?

Nós tivemos uma conversa muito agradável esses dias. A Carmen é uma figura que tem o meu carinho, o meu respeito. Uma mulher combativa, que presta um serviço excelente serviço pro país na área de saúde, mas existem preferência políticas. Ela tem as dela, eu tenho as minhas. A partir do momento em que assume um partido político com essa dicotomia, vai ter que resolver essas diferenças, mas eu ainda não cheguei nesse momento. Ainda não discuti sobre isso com a Carmen Zanotto porque eu ainda não tomei essa decisão de entrar no partido.

Em uma das últimas entrevistas que a gente fez no Parlatório, da Som Maior, disse que estava flertando muito. Hoje os flertes reduziram?

Reduziram. Hoje a gente tem um lastro menor de evidências partidárias. São caminhos diversos, eles não têm a mesma base ideológica, um é mais pra cima, outro é mais pra baixo, mas no geral fogem da extrema-direita e da extrema-esquerda.

Quem está merecendo o flerte da Paulinha hoje?

A gente tem tido conversas importantes com o próprio Psd, com o Mdb, com o Cidadania, como a gente falou bastante, mas com a delicadeza que o assunto ainda requer.

Três partidos têm em comum essa mesma questão de que não se sabe se estarão com Moisés no ano que vem.

É. Eu vou te dizer que é um elemento que precisa ser posto na mesa porque eu tenho trazido essa questão com muita clareza. Não é que eu prefiro o A pelo B. É uma questão de processo. Aqui mesmo na Capital, quando o Gean Loureiro (Democratas, futuro União Brasil) se colocou como candidato à reeleição, uma das questões era que Florianópolis merecia uma reeleição para concluir um processo que iniciou. É isso que a gente também tem em mente que deve acontecer no governo do Estado. Eu sempre digo que existe um ciclo que precisa ser concluído. No governo, o Moisés tem se credenciado para concluir esse momento, esse processo que Santa Catarina vem edificando.

Esse ciclo por muito pouco não foi abreviado naqueles momentos do impeachment e a senhora estava na liderança de um governo que praticamente não tinha mais base. Era você e mais cinco. Estava na linha de frente, se expôs muito. O que guarda daquele momento em que tudo parecia ir para o brejo?

Foi uma escola. Eu aprendi como se deve fazer política e como se deve nunca, jamais, fazer política. Foi um período de muito sofrimento, de realmente eu desejar nunca ter vindo para cá, mas enfim. Aprendi que mais do que nunca a gente precisa lutar pelo o que a gente acredita. Vou te dizer, vale a pena. O momento foi sofrido, no frigir dos ovos estava eu lá fazendo defesas apaixonadas, que ninguém acreditava, que ninguém deu importância. O nosso tom não ecoou dentro da Casa, mas eu entendo com carinho que não era sobre mim, nem sobre o próprio Moisés para dizer a verdade. Era sobre um processo. Sistemicamente se faz política do mesmo jeito em Santa Catarina há 100 anos. De repente o jogo muda, as pessoas não vão ficar simplesmente aplaudindo esse cenário, vendo uma série de privilégios e outras questões sendo alteradas.

Mudaram esses ou mudaram os Moisés?

Eu acho que o acerto de contas para chegar ao governo mudou mais esses do que o Moisés. O voto do Sargento Lima (Psl) foi consagrador, à medida em que o Lima preserva o voto dele numa condição diferente aos demais, o jogo se revigora (no primeiro Tribunal do Impeachment, Lima votou apenas pela abertura do processo contra Moisés, poupando a Daniela Reinehr e acabando com a chance de dupla cassação).

E aí o que eu enxergo do governo: uma leve bandeirinha da paz dizendo para parar de brigar por enquanto. Essa briga vai ser retomada na eleição, não pensem vocês que a gente vai ter um processo eleitoral pacífico. Eu não penso isso.

Quando você se elegeu, era muito próxima do Júlio Garcia (Psd), que assumiu a presidência da Alesc, naquele início de mandato foi se aproximando de Moisés. Quando Moisés e Júlio Garcia se antagonizaram, escolheu Moisés. Depois, Júlio Garcia passou a ser apoiador do governo. Como é sua relação com Júlio Garcia hoje?

Amorosa, um relacionamento muito respeitoso, mas naturalmente distante. Nós não temos mais ambiente para sentar e discutir sobre política, mas eu tenho muito respeito pelo Júlio, pelo o que ele representou a Santa Catarina, ele tem uma história que fala por si. Mas, de fato, por isso que eu digo, se eu fosse escolher apenas pelo lado pessoal, relacional, talvez o meu lado fosse outro porque os meus relacionamentos de muitos anos, eles vinham de outros lugares. O Moisés eu mal conheço, mas aquilo que ele impõe para o governo, no meu ponto de vista, tem mais a ver com os meus valores, com aquilo que eu acredito, aquilo que eu penso para Santa Catarina.

Você gostaria que o Moisés estivesse no partido que você escolher?

Eu vou escolher o partido que vou de coração e vou para fazer uma construção verdadeira. Eu não consigo mais me matricular na questão partidária. Eu tenho dito isso em largas palavras, assim, uma ficha de filiação partidária não define caráter, eu não quero estar com as pessoas por conta disso. Tem pessoas de outros partidos que as circunstâncias não nos permitem dividir a mesma cadeira, mas eu vou estar com elas até morrer. Então, de verdade, eu não dou a mínima para o partido onde ele vai estar.

A saída do Pdt, onde a senhora entrou criança, já está cicatrizada?

Já consigo falar sem chorar sobre o assunto. Foram 32 anos, tem amigos que dizem “ah, Paulinha, o que tu tem na tua cabeça?”, mas enfim eu tive muitos momentos de alegria no Pdt e sou muito grata ao que o Pdt me permitiu conhecer e viver nesse linear dessa história, mas a página virou, né?

Eu, francamente… Sabe quando tu é muito apaixonado, cegamente apaixonado por alguém, mas todo mundo sabe que não vai dar certo, que tu deveria terminar esse namoro, e tu não terminas, aí de repente acontece um episódio e a pessoa te larga. E aí passa um tempinho, tu olha e pensa como pôde gostar daquela pessoa por tanto tempo.

Você viveu um relacionamento abusivo no Pdt?

Ah, com certeza absoluta. Totalmente. Não sempre, volto a dizer, muitos anos de alegria, mas depois que eu assumi o mandato. Vou falar uma coisa bem importante, não querendo trazer a questão de gênero, mas a mulher eleita, se espera que ela seja boazinha. Se espera que ela seja boa política como ela é boa mãe, como ela é boa esposa, como ela é boa irmã. Quando ela pensa por si própria e se impõe, ela passa a ser repelida do ambiente partidário, do ambiente coletivo.

O seu grande problema com o Pdt foi ter feito 50 mil votos?

Com certeza absoluta. Depois disso, pela primeira vez na vida o Manoel Dias (Pdt) ficou duas semanas sem falar comigo. E tu sabe? O porta-retrato continua na minha mesa. Tem gente que pergunta se eu não vou tirar, mas…

Naquela eleição ele fez 20 mil.

Por isso que ele ficou brabo, ele achou que eu não tinha trabalhado o suficiente por ele.

Dava para ter ajudado mais?

Impossível. O Manoel é uma figura que tem o seu valor para o Estado e tudo mais, mas não é o tipo de candidato que o eleitor catarinense deseja votar e eu não tenho nada a ver com isso, eu não posso fazer diferente. Essa história de manter currais eleitorais a serviço de A ou de B, não existe mais. Estão aí as redes sociais, os movimentos políticos contemporâneos que, graças a Deus, não nos deixam mentir.

A gente falou bastante de política aqui e a culpa é minha, admito, mas olhando pro seu mandato, uma deputada muito atuante, corre bastante. Qual é a ação que marca o seu primeiro mandato como deputada estadual?

Para mim, a mais relevante delas é a Escola de Líderes. Eu acredito que estamos aqui para construir um Brasil melhor. Sou uma idealista, sonhadora convicta. Isso não é possível se não tiver coletivo, se não tiver mais pessoas envolvidas. Nosso mandato tem trabalhado o empoderamento de vereadores, dos prefeitos de pequenas cidades, nas mais diversas formas, nas mais diversas correntes. A escola já formou mais de mil pessoas nesse ano. Além disso, a gente tem matriculado nosso coração em pautas estratégicas das pequenas cidades, sem evidentemente perder o olhar para as questões macroeconômicas do estado e para as grandes obras estruturantes. O nosso mandato tem uma disposição implacável para atender questões de saúde pública porque à medida em que a economia se torna recorrentemente forte, o equilíbrio social se dá por meio da necessidade mais elementar que é a saúde. É um mandato tão plural, agora mesmo a gente fará esse encontro e estou preparando a pauta de apresentação do mandato. Nós temos mais de 50 temas que a gente advoga nesse mandato.

Eu sei que a senhora tem candidato a governador, é óbvio, mas a presidente você já tem?

A presidente eu estou esperando, como todo mundo, a terceira via. Uma coisa que não combinava comigo e com o Pdt, era que eu não conseguia concentrar minha energia em um revanchismo exacerbado.

Ser contra o Bolsonaro não significa ir para rua chamar ele de ladrão, assassino, bandido, sei lá o quê. Eu não acho que, eticamente, a gente deva adjetivar as pessoas de forma pejorativa para se contrapor a elas. Eu acredito na amizade cívica, plural e na discussão das diferenças de forma respeitosa. A mesma coisa eu me refiro ao ex-presidente Lula, é inadmissível que ele seja achincalhado cada vez que ele anda na rua por um grupo de pessoas que não concordam com o jeito de ele pensar e agir.

No meu ponto de vista, o nosso país precisa descortinar um novo espaço, a discussão de um terceiro tempo que venha com novos nomes. É evidente que está fora da nossa governança, é um desejo que eu tenho no meu coração de que haja uma opção diferente para a sociedade votar. Não é a discussão sobre quem vota no Bolsonaro ou do Lula é do bem ou do mal, é que só tem isso pra votar hoje no país. Quando tiver outra coisa, quem sabe a sociedade possa caminhar para outro rumo.

Bom, se não gosta de xingar um e xingar outro, o Ciro Gomes era um problema porque ele xingava os dois…

Exato, é o jeito. Ele é um cara muito inteligente, é uma diferença pontual que eu faço do Pdt, é um homem brilhante, com mil qualidades, mas tem um destempero assim, um negócio que desconecta eventualmente da racionalidade e que lhe tira o equilíbrio, eu acho que isso também não é bom para o país.


Sobre a foto em destaque:

A deputada estadual Paulinha (Pdt) me recebeu em seu gabinete na quarta-feira. Foto: Valquíria Guimarães, Divulgação.

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