Com uma longa trajetória eleitoral em que, como ele mesmo dia, já “ganhou, perdeu e empatou”, o deputado estadual Ismael dos Santos (Psd) se prepara para um salto: vai disputar pela primeira vez uma vaga na Câmara dos Deputados. Esse salto, no entanto, não é no escuro. Na entrevista que me concedeu em seu gabinete na Assembleia Legislativa, o parlamentar mostrou todo seu lado metódico ao avaliar o cenário propício e a matemática necessária para chegar ao Congresso. Ninguém mais do que ele sabe o quanto a aritmética é importante: em 2002 foi o candidato mais votado para a Assembleia Legislativa, mas não se elegeu porque seu partido à época, o Psb, não alcançou o quociente eleitoral.

Político cristão, como ele se define e faz questão de diferenciar de “cristão político”, Ismael dos Santos conquistou uma importante condição para a disputa de 2018. Foi escolhido para ser o único candidato a deputado federal com apoio oficial da Assembleia de Deus – condição que ele disputou com a deputada federal Geovânia de Sá, que vai à reeleição sem esse endosso. A tucana foi entrevistada na Conversa em Dia publicada na última quarta-feira. Na entrevista, Ismael elogia a parlamentar e diz que ela é, como ele, uma política cristã. Mas avalia que ela passou a ter uma relação passional com o Psdb a partir do momento em que virou presidente estadual do partido, em 2019, e que isso gerou uma série de desgastes no meio evangélico que culminaram no apoio à pré-candidatura presidencial do governador gaúcho Eduardo Leite nas prévias do Psdb vencidas pelo governador paulista João Dória.

Curiosamente, Eduardo Leite avalia o convite público do presidente nacional do Psd, Gilberto Kassab, para ser o presidenciável do partido. Ismael garante que se isso acontecer, não pedirá votos para o gaúcho e manterá o apoio ao presidente Jair Bolsonaro (Pl). É essa lógica de fidelidade ao bolsonarismo que faz com que ele ainda sonhe com a candidatura do prefeito chapecoense João Rodrigues (Psd) ao governo.

Leia a íntegra da entrevista:

Deputado, são três mandatos como titular de deputado estadual…

Antecedidos por três de vereador (risos).

E agora o senhor tenta alçar um voo maior. Por que a disputa pela Câmara dos Deputados neste momento?

Primeiro, a biografia. São 30 anos de caminhada política, derrotas, vitórias. Poderia dizer um empate, quando foi o mais votado e não cheguei. Entendo que está maduro e há uma pressão da base nesse sentido, de que a gente efetivamente tente escalar um novo degrau. Então, pela perspectiva da biografia, mas também pela perspectiva do cenário. O cenário passou a ser atraente por algumas razões. Em especial, pela região.

Blumenau teve três deputados federais, hoje não tem nenhum. Com 230 mil eleitores, o Vale do Itajaí tem 1 milhão de eleitores. Tem um grande deputado, que é o (Rogério) Peninha (Mdb), que não será mais, já declinou da sua reeleição. O Vale passa a ficar órfão de um deputado. Isso também atrai a perspectiva de uma candidatura.

E também o cenário do segmento a que estou muito ligado, por circunstâncias alheias à nossa intenção, ao nosso projeto. Eu tinha uma eleição bem encaminhada para deputado estadual. Não existe eleição ganha, existe eleição bem encaminhada. E essa era uma eleição bem encaminhada para fazer 60 mil, 70 mil votos, o que me daria as condições de estar entre os primeiros do Psd. Essas seriam as três perspectivas de cenário que me empurram para um projeto político partidário em nível de Brasília.

Nas últimas semanas aconteceu a decisão da Assembleia de Deus para que o senhor seja o único candidato oficial em Santa Catarina para a vaga de deputado federal. Em uma disputa interna com a candidatura da deputada federal Geovânia de Sá (Psdb). Como se deu esse processo? Fica alguma rusga?

Não, eu tenho amizade com a Geovânia, sempre com muito respeito. Acho que a Geovânia teve a sua caminhada, sua biografia, seus méritos. Mas, nesse momento, houve uma indisposição em relação à pauta que a deputada agora defendeu a pauta que o segmento defende. Então, houve um fio desencapado aí nessa perspectiva de pautas de valores.

Esse “fio desencapado” é o apoio a Eduardo Leite?

Foi uma série de situações que culminaram com a questão do Eduardo Leite, que não tem a simpatia do segmento, que no momento é majoritariamente Bolsonaro. Então, isso foi uma das razões. Mas houve algumas questões de voto no plenário. Por exemplo, a questão do deputado Daniel Silveira (deputado federal do Psl do Rio de Janeiro que foi preso após vídeos com ameaças a membros do Supremo Tribunal Federal), que trouxe um atrito interno aqui (Geovânia votou a favor da manutenção da prisão). Teve uma questão pessoal dela, que não vem ao caso aqui, em relação à família, de foro íntimo. E falando como espectador, acho que ela foi extremamente passional em relação ao partido. Isso acabou importunando, incomodando certos líderes no sentido de que ela tomou as rédeas do Psdb e a realidade político-partidária acaba interferindo nas questões locais. Isso se deu muito presente na campanha para prefeito e vereador nas diferentes regiões de Santa Catarina.

Vou lhe fazer uma pergunta que fiz a ela: o que significa ser um parlamentar evangélico?

Existe uma diferença entre ser um cristão político e um político cristão. O político cristão é aquele que tem a formação, tem a biografia, que tem a história e que tem também a sua fé. Outra coisa ser um cristão que se joga na política. E aí é um aventureiro. Eu acho que essa é a distinção.

A Geovânia eu vejo como uma política cristã que, na minha modesta opinião, foi passional e emocionada demais pelo partido. Eu aprendi uma coisa desde os meus primeiros embates, em 1988 foi minha primeira eleição: nunca se apaixone por um partido.

Por falar em partido, o senhor está no Psd há muito tempo, desde sua fundação em 2011, mas era do Democratas e antes do Pfl, que aqui em Santa Catarina foi uma transição contínua. E sua primeira eleição para deputado estadual foi um insucesso glorioso: o senhor foi o mais votado do Estado em 2022 e não conseguiu a cadeira pelo Psb por falta de legenda. Com essa memória, preocupa a questão partidária, nessa lógica aritmética, para se eleger deputado federal?

Claro, eu tenho dito que a política é cenário, política é matemática, política é estratégia, política é equipe. São quatro vetores que eu aprendi ao longo desta caminhada, estou indo para a décima segunda eleição. E matemática tem que estar na ponta do lápis. O candidato minimamente racional precisa fazer conta de padeiro.

Então, nesse momento o Psd me dá conforto e me dá tranquilidade. Tem dois deputados federais. Podemos fazer um terceiro? Podemos, mas se não fizermos, teremos dois. Tenho absoluta convicção disso. Para isso, eu tenho que fazer acima de 80 mil votos. A nossa meta hoje é 100 mil votos, três dígitos. Vamos buscar isso. Fiz 54 mil na última eleição de deputado estadual, com aquele tsunami da onda 17. Então isso nos dá musculatura para buscarmos uma das duas vagas que está lá.

Então o senhor não vê necessidade de fazer uma migração partidária?

Não. Exceto se houver uma imposição do diretório nacional na perspectiva de um apoio à esquerda. E aí, foge aos nossos parâmetros. Mas não acredito nisso, até porque os deputados (Ricardo) Guidi e Darci (de Matos) tem dado sustentação ao atual governo, (Gilberto) Kassab (presidente nacional do Psd) sabe disso e sabe que em Santa Catarina nós não temos como caminhar com a esquerda.

A gente falou de Geovânia de Sá e Eduardo Leite. Kassab está convidando Eduardo Leite para se filiar ao Psd e concorrer à presidência. Faria campanha para ele?

Não, em momento algum. Primeiro, por uma questão, repito, de não que ele não está alinhado com as nossas pautas e valores. Não vou julgar aqui a gestão dele. Não conheço, não acompanho o Rio Grande do Sul, mas ele não fecha com a proposta do segmento que eu defendo e com a pauta de valores que eu defendo.

Como o senhor vê o cenário aqui em Santa Catarina? O Psd tem duas pré-candidaturas, Napoleão Bernardes e Raimundo Colombo, e a possibilidade de apoiar Gean Loureiro, do União Brasil…

Eu vou colocar uma terceira (no Psd).

Eu ainda não desisti do João Rodrigues.

Acho que nós temos essas três. São três candidaturas que representam segmentos diferentes. O Napoleão, representando a novidade, a juventude. O Raimundo representando a maturidade e a experiência. E o João Rodrigues representando efetivamente essa linha mais à direita, bolsonarista. Conversa muito bem, transita muito bem, dialoga muito bem com a base bolsonarista. Então temos três nomes potenciais que podem efetivamente até 31 de março nos darem um caminho de uma candidatura própria.

Como o senhor vê esse cenário nacional de polarização entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Lula?

Ruim, negativo. Ideologicamente pode ser interessante, mas não do ponto de vista da economia, de um futuro, do Brasil que temos e do Brasil que queremos. Seria bom se pudéssemos distender um pouco se essa corda esticada.


Sobre a foto em destaque:

Ismael dos Santos me recebeu em seu gabinete na Assembleia Legislativa. Foto: Soledad Urrutia, Divulgação.

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