Santo de casa faz milagre? Diz o ditado que não, mas o ex-governador Raimundo Colombo (Psd) pareceu bem à vontade em sua terra natal, Lages, para ensaiar um esboço do discurso que pode apresentar caso seja candidato ao governo do Estado pela terceira vez. Eleito em 2010 e 2014, o pessedista concedeu uma longa entrevista à Rádio Clube na terça-feira em que voltou a criticar o governador Carlos Moisés por “aumentar impostos toda hora” e disse que o Plano 1000 é “uma fraude” porque não haverá tempo hábil para repasses de recursos este ano, o que deixará a conta para o sucessor. Fez, inclusive, uma profecia de insucesso eleitoral para o atual governador:

– É um governo que termina este ano e não vai renovar. Não sei quem vai ser o governador, mas este não vai continuar, com certeza, porque é realmente um governo desastrado.

Durante os 40 minutos de entrevista, Colombo nem citou o nome de Moisés. Criticou muito a gestão, especialmente na questão tributária. O pessedista sempre bate na tecla de que o governo deveria fazer compensações à sociedade neste momento de exuberância arrecadatória em vez de, segundo ele, encher o caixa. É nessa lógica que se estabelece o confronto direto nas narrativas de Colombo e Moisés. O ex-governador – seguindo a linha recentemente adotada pelo deputado estadual Júlio Garcia (Psd) em entrevista à Rádio Som Maior, credita os recordes de arrecadação à inflação, aos repasses de recurso do governo Jair Bolsonaro para combate à pandemia e à suspensão por um ano da dívida com a União.

Colombo também seguiu a trilha de Júlio Garcia ao falar do Plano 1000 – o programa que promete repassar, em cinco anos, recursos milionárias às 295 prefeituras catarinenses proporcionalmente à população de cada uma. O ex-governador afirmou que a lei eleitoral proíbe convênios com os municípios depois de abril e que isso fará a conta ficar para o próximo governo. No entanto, não perdeu a chance de ironizar o governador e linkar a fala às críticas sobre a arrecadação de impostos.

Tomara que ele libere o dinheiro, porque tira tanto dinheiro do povo, de uma forma tem que devolver.

No microfone da Rádio Clube, Colombo criticou o aumento do Ipva em 27%, a recente retirada de incentivos fiscais de produtores de leite e disse que “o presidente Bolsonaro” tem razão nas crítica que faz aos governos estaduais, Santa Catarina incluso, pelo aumento da arrecadação do Icms nos combustíveis. Afetados pela variação internacional do preço do petróleo, o aumento do preço dos combustíveis se reflete no caixa do Estado porque a alíquota é um percentual – 25% – sobre o preço final.

Aí vem outro ponto interessante da entrevista de Colombo e que indica que começa a vestir as roupas e as armas de candidato a governador. Crítico ao presidente Jair Bolsonaro (Pl) desde antes das eleições de 2018, o ex-governador sinalizou que vai amenizar o discurso em relação a ele. Relacionou sua eleição em 2018 ao desejo de mudanças pela população e disse que, embora não goste do estilo confrontador, ele “tem coisas boas”. Apontou também que deve ficar distante da candidatura do ex-presidente Lula (Pt) ao dizer que “a opção que a gente tem a sociedade não gosta, principalmente no Sul do Brasil”. Colombo diz torcer por uma alternativa de terceira via, embora admita não ver potencial eleitoral nos nomes ventilados até agora. Não citou o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, pré-candidato do Psd ao cargo.

Sobre a própria condição de pré-candidato ao governo, Colombo disse ter dois meses para decidir, mas deu indícios de que quer ir para o jogo. Citou como alternativa no Psd o ex-prefeito blumenauense Napoleão Bernardes, a quem encheu de elogios, mas apontou como um quadro para o futuro. Ignorou a possibilidade de aliança com o prefeito florianopolitano Gean Loureiro (Democratas), que costura com Júlio Garcia e o ex-senador Jorge Bornhausen uma chapa em que Colombo seria candidato ao Senado. Em típico movimento de candidato, Colombo chegou a dizer que se for eleito governador não vai disputar a reeleição em 2026.

Não tenho nenhuma disposição e já assumo compromisso comigo mesmo de não ir à reeleição. Seria um governo de transição. Arruma a casa e entrega para a nova geração.

À vontade em Lages e na Rádio Clube do amigo Roberto Amaral, o ex-governador não entrou em detalhes sobre costuras e alianças políticas. O que se vê nos bastidores é que ele aguarda a consolidação da composição entre Moisés e o Mdb para avançar as conversas com o Progressistas do senador Esperidião Amin, também pré-candidato ao governo. Ambos se aproximaram muito em 2018, quando compuseram chapa para as duas cadeiras em disputa no Senado – Amin foi eleito, Colombo ficou em quarto lugar. No entanto, Amin também se aproximou muito de Moisés.

O esboço de discurso de Colombo traz uma narrativa factível para um confronto que Moisés também deseja fazer. A comparação de gestões é um clássico das disputas eleitorais. Mas mesmo que afie o discurso de anti-Moisés, o ex-governador ainda tem dificuldades de compor uma aliança sólida. No cenário atual, corre sério risco ver abater sobre si mesmo destino da chapa de Paulo Bauer (Psdb) e Joares Ponticelli (Progressistas) em 2014, quando foram derrotados por Colombo. Na época, os prefeitos tucanos e progressistas não saíram de casa para pedir votos a dupla. Estavam agradecidos pelos repasses feitos por Colombo através do Fundo de Apoio aos Municípios (Fundam) – um primo distante do atual Plano 1000.

Leia a seguir trechos da entrevista de Raimundo Colombo à Rádio Clube, de Lages:

Sobre ser candidato ao governo:

Dois sentimentos me dividem. Primeiro, nós fizemos a nossa parte. A gente lutou muito e é importante também que outros tenham oportunidade. Por outro lado, há um sentimento de dever. Eu acho que nesse momento de dificuldades, de desafio, você não pode fugir da luta, você tem que se colocar à disposição.

Nós temos uma situação muito grave em Santa Catarina. Estamos perdendo competitividade. O Estado está cometendo erros. Nossa grande competição, o que nós fizemos, e o (ex-governador) Luiz Henrique (da Silveira, do Pmdb) fez um grande trabalho e nós conseguimos continuar, foi realmente fazer de Santa Catarina um Estado competitivo. Foi o Estado que mais cresceu no Brasil no nosso período, o maior número de empregos, os melhores indicadores sociais, o mais baixo índice de mortalidade infantil, a maior longevidade, a maior empregabilidade, o mais baixo nível de analfabetismo, o Estado se transformou em um show. Aí nós fizemos essa aventura com esse governador que está aí. Ele tem a filosofia completamente diferente. Começou a aumentar impostos e tirar a competitividade do Estado.

Eu não tenho medo. Ganhar ou perder faz parte do jogo.

Estou pronto para ser candidato, mas não vou impor candidatura.

Não faz sentido para mim ser candidato de novo só por ser. Tem que trazer realmente uma mensagem, um posicionamento de um futuro. Quando você nunca foi, você diz “eu quero ir”. Mas eu já fui, eu acumulei uma experiência. Então, para mim tem que ser uma missão. Uma decisão que eu já tenho: se eu for candidato a governador, eu não serei candidato a reeleição. É quatro anos e ponto. Não tenho nenhuma disposição e já assumo compromisso comigo mesmo de não ir à reeleição. Seria um governo de transição. Arruma a casa e entrega para a nova geração.

Não adianta o Estado ir bem e as pessoas irem mal. Não adianta o Estado estar com o caixa cheio e as empresas quebrando. Esta é a diferença. Aliás, esta é toda a diferença que se estabelece. Isso motiva a gente a defender esta linha de ideologia, esta linha política, de resultado, de eficiência, de melhorar a vida das pessoas, de fazer um Estado dinâmico.

Sobre o governo Carlos Moisés:

A inflação gera uma consequência social muito grave, porque ela concentra renda. Essa inflação não é uma inflação de consumo. As pessoas não estão consumindo mais. Ela é uma inflação de custo, os custos subiram. Então, de um lado o salário mínimo é R$ 1.212, as pessoas perdendo o poder de compra. E de outro lado, a insensibilidade, principalmente aqui do governo sobre Catarina, aumentando impostos toda hora.

A questão da gasolina, o presidente Bolsonaro tem razão. Uma coisa é subir o petróleo lá fora. O dólar aumentou, aumenta o preço do petróleo. Mas você cobra o imposto no final no meio de uma pandemia. O Estado deveria ajudar as pessoas. E não, nós estamos enchendo o cofre. Agora subiu o Icms do leite. É um negócio incompreensível. Essa filosofia está errada e vai tirar a competitividade de Santa Catarina.

Na pandemia, o governo federal suspendeu o pagamento das dívidas. Isso deixou um mundo de dinheiro em caixa nos estados. Ele também repassou uma fortuna de dinheiro para atender a saúde. E o pessoal usou para pagar folha de salário também na pandemia. Então, houve uma série de vantagens muito importantes e que o Estado não aproveitou. 

O governador ganhou na loteria, chegou numa situação que ninguém esperava, nem ele próprio. É claro. A pessoa não está esperando, não está preparada. Tinha que dar um tempo para ele se organizar. Mas o primeiro ato dele foi um ato ruim. Ele foi eleito na sombra do Bolsonaro, ele foi eleito pelos votos do Bolsonaro, e a primeira atitude dele foi romper com Bolsonaro. Romper ou não é problema dele, mas prejudicou Santa Catarina e está prejudicando até agora. Tanto é que você não vê obras do governo federal. Então, o Estado em que o Bolsonaro foi o mais bem votado do Brasil, o governador rompeu com ele. Foi o primeiro grande erro. O segundo é que ele veio em torno de uma moralidade, mas na verdade houve uma série de escândalos no governo. Eu não gosto de falar dessas coisas, mas a verdade é que isso fragilizou o governo. Ele veio para ficar contra os políticos, começou ficando contra os políticos e depois ele se acertou com os políticos. Hoje quem governa praticamente são os deputados.

Este governo, e as pesquisas mostram isso, é um governo que termina este ano e não vai renovar. Não sei quem vai ser o governador, mas este não vai continuar, com certeza, porque é realmente um governo desastrado. “Ah, mas ele anunciou várias obras”. Por exemplo, a estrada do Corvo Branco nem começou ainda e foi anunciada em agosto. Esse dinheiro que vai dar R$ 1 mil por habitante de cada cidade, uma cidade com 150 mil habitantes receberá R$ 150 milhões. Esse dinheiro está aí? Não. Esse dinheiro é em cinco anos. Mas o mandato termina no final do ano? Como pode alguém comprometer quatro anos além? Mas a lei eleitoral proíbe fazer convênios seis meses antes (das eleições, em outubro). E até o final de março, você tem que ter a licitação da obra e o primeiro pagamento. Então, praticamente não vai pagar nenhum tostão. Isso é uma fraude. As pessoas estão fazendo uma festa de uma coisa que de fato não existe, é uma mentira. Agora, tomara que ele libere o dinheiro, porque tira tanto dinheiro do povo, de uma forma tem que devolver.

Sobre o governo Jair Bolsonaro

O presidente Bolsonaro teve uma eleição surpreendente, um fenômeno realmente impactante do Brasil e mostrou o desejo de mudança da sociedade. Mudança estrutural, isso é um bom sentimento. Esse sentimento permanece. É claro que foi um governo tumultuado, com muitas dificuldades na própria pandemia. Foi um componente inesperado e realmente duro.

Acho que o presidente foi muito radical na sua defesa da não vacinação, relativizando a vacinação. Isso tem gente que segue, mas a grande maioria não segue.

O processo de governo fez com que se criasse dois extremos, radicalizou muito a política no Brasil. Eu não gosto disso, porque eu acho que o Brasil é um país que precisa de desenvolvimento, que precisa corrigir as injustiças sociais, que precisa gerar novos valores. E o Bolsonaro tem coisas boas que eu gosto, tem coisas que ele fala e fala para mim. Eu não gosto do jeito dele, acho que ele vai muito para o confronto, acho que o linguajar que ele usa às vezes não é o adequado. Eu respeito, ele é o nosso presidente, torço para que dê certo. A opção que a gente tem a sociedade não gosta, principalmente no Sul do Brasil, pessoal não quer a esquerda de jeito nenhum. Particularmente, eu desejo que surja uma terceira via. Ela me acalma, mas neste momento não vejo ninguém com potencial eleitoral. Espero ainda e ainda tem tempo que isso aconteça.

A estrada da Coxilha Rica

O que eu apanhei quando fizemos o asfalto da Coxilha Rica. “É uma vergonha, está fazendo para a fazenda da família dele, isso é um crime”. E muitos lageanos, amigos meus, dizendo uma calúnia dessa, uma ofensa tão nojenta como essa. Eu fiz várias estradas parecidas em outras cidades que me fizeram receber o título de cidadão honorário e aqui parecia que eu era um bandido por ter feito uma estrada “que leva nada a lugar nenhum”. Vai lá ver hoje como é que está. Surgiu agora um hotel, de uns empresários de Blumenau, que é uma referência nacional de turismo rural e que vão surgir outros em consequência desse. A produção de grãos de Lages saiu de praticamente nada para mais de dez mil hectares e o potencial é mais de trinta mil. Uma obra não é apenas asfaltar uma rua, é promover o desenvolvimento, é levar condições para que aqueles que possam produzir riqueza e gerar oportunidade de trabalho façam isso.


Sobre a foto em destaque:

Com jeito de candidato, o ex-governador Raimundo Colombo (Psd) abraça os cachorros Farofa e Feijão. Foto: Facebook de Raimundo Colombo. 

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