O governador Carlos Moisés (sem partido) não foi para Brasília tentar convencer o ministro Tarcísio de Freitas a usar apenas nos lotes 1 e 2 os R$ 2oo milhões que o Estado reservou para aportar na obra federal da BR-470. Ele foi para garantir isso. Para solucionar o impasse entre o plano do governo estadual de viabilizar a conclusão dos trechos mais adiantados da duplicação antes do início da campanha eleitoral de 2022 e intenção do ministério de pulverizar o dinheiro em trechos menos avançados, ele precisou de estratégia e de R$ 100 milhões a mais.
Antes de mostrar o dinheiro, veio a estratégia. Moisés voou para Brasília na noite de segunda-feira para participar na manhã seguinte da audiência pública da Comissão de Serviços de Infraestrutura do Senado sobre as obras federais em Santa Catarina. Tinha como aliados o senador Esperidião Amin (Progressista), autor do requerimento, e Dário Berger (Mdb), presidente da comissão. Como antagonista, o senador Jorginho Mello (Pl) – fiel membro da base do governo Jair Bolsonaro, próximo do ministro Tarcísio e influente junto ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) desde outros carnavais – ou melhor, governos federais.
Jorginho e o Dnit-SC defendiam que os recursos do governo estadual fossem utilizados no lotes 3 e 4, entre Blumenau e Indaial, que atravessam trechos urbanos e demandam custos com desapropriações. Havia bons argumentos técnicos para isso, mas também a constatação política de que por lá o dinheiro estadual não daria muita visibilidade em 2022. Em busca de uma solução, Amin e Dário viabilizaram uma agenda prévia de Moisés com o ministro Tarcísio, uma hora antes da audiência pública. Jorginho não só não foi chamado, como não sabia do encontro.
Na hora marcada, no entanto, o governador não estava presente – enviou o secretário de Infraestrutura Thiago Vieira e o chefe de gabinete Márcio Ferreira. O encontro prévio não resultou em nada, com os representantes dos governos federal e estadual mantendo suas posições já conhecidas. E assim começou a audiência pública, com o ministro Tarcísio de Freitas dando os sempre bem argumentados nãos que Santa Catarina tem se acostumado a ouvir, como no caso do pleito por uma segunda pista de pouso no Aeroporto de Navegantes. Como o ministro não ia ao Senado há dois anos, os senadores de outros Estados aproveitaram o momento para apresentar seus pleitos, o que estendeu a reunião. Passava das 13h quando Moisés recebeu a palavra e ficou claro porque ele não havia ido ao encontro prévio: estratégia, do grego strateegia, como ensinou Capitão Nascimento nos cinemas.

No embate político, Moisés levou a melhor sobre Jorginho. Foto: Roque de Sá, Agência Senado.
O governador catarinense não foi encontrar o ministro na Esplanada dos Ministérios para não queimar de largada o trunfo que levava para Brasília: estava disposto a aportar R$ 100 milhões a mais na BR-470, nos lotes entre Blumenau e Indaial, desde que fossem utilizados os R$ 200 milhões previstos no trecho avançado entre Navegantes e Gaspar. O que se viu a partir daí foi uma das mais resolutivas audiências públicas da história do Senado. Tarcísio explicou que questões técnicas impedem a obra de deslanchar ainda em 2021, mas que com os recursos do Estado é possível concluir os lotes 1 e 2 até julho do ano que vem, além de ter um avanço considerável nos lotes 3 e 4. Assumiu o compromisso de não usar os recursos do Tesouro Estadual em desapropriações. Abriu o sorriso. Estava preparado para responder todos os questionamentos dos catarinenses, não para ser surpreendido com recursos extras. A auxiliares, o ministro brincou:
– Seria bom que toda audiência fosse assim, né?
Moisés garantiu o que queria. A duplicação da BR-470 é um drama humano e econômico que o Vale do Itajaí não suporta mais viver – e nem ouvir prazos e promessas dos governos federais. Ajudar a viabilizar a obra é o tipo de ação que pode colocar um governador na história da região. Isso tem inegáveis dividendos eleitorais. A conferir se o excesso de generosidade com Brasília não afeta as necessidade que o Estado precisa custear com seu orçamento.
Nessa ida a Brasília, o que se viu foi um ministério com o pires na mão. O pedido por obras de terceira faixa na BR-282 entre Florianópolis e Lages, que levou uma ampla comitiva de políticos e empresários da cidade serrana para a audiência pública, ficou à beira da frustração. Mesmo com a bancada federal prometendo destinar emendas e Moisés sugerindo aportar ali também dinheiro estadual, ainda falta o projeto do Dnit. Tarcísio prometeu acelerar a demanda.
A quase conclusa BR-285, no Sul do Estado, ouviu as mesmas promessas de que será concluída até o final do ano, embora quem acompanhe a obra de perto não creia. É outra que pode receber dinheiro estadual. O novo pacote de bondades do caixa do Estado com a União, incluindo os R$ 100 milhões extras da BR-470, precisa ser aprovado na Assembleia Legislativa. E será – o presidente Mauro de Nadal (Mdb) estava ao lado do governador para atestar a promessa. Por sorte nossa e azar do governo federal, tiraram Moisés de lá antes que bancasse obras em outros Estados.
Sobre a foto em destaque:
Governador Carlos Moisés olha para a argumentação do ministro Tarcísio de Freitas, na audiência comandada pelo senador Dário Berger. Presidente da Alesc, Mauro de Nadal compõe a mesa. Foto: Roque de Sá, Agência Senado.