O futuro partidário de Jair Bolsonaro é como as nuvens: você olha e está de um jeito, olha de novo e está de outro.  Adaptei a frase clichê de Magalhães Pinto sobre a política porque cabe como uma luva sobre a nova legenda do presidente da República – uma novela que tende a se arrastar até 2022 e que, ao ser concluída, vai equacionar muitas peças do tabuleiro político nacional e também nos Estados. Olhando para as nuvens bolsonaristas hoje, Jair Bolsonaro está próximo de dois partidos em que já esteve filiado em sua errática carreira eleitoral: o Progressistas (Pp) e o Ptb.

Já escrevi aqui que considerava improvável que Bolsonaro optasse pelo Pp, considerando que se trata de um partido há décadas acostumado a ser um gigante sem cabeça, com muita autonomia para os diretórios estaduais construírem seus projetos próprios e potencializarem seu caciques locais – além da falta de puder do comando nacional de estar uma eleição com Dilma Rousseff (Pt), outra com Geraldo Alckmin (Psdb), ou vice-versa. O presidente dava sinais muitos claros de que queria um partido em que pudesse ter controle sobre as ações, em plano nacional e nos Estados, algo que não teve no Psl após as eleições de 2018 e que uma disputa de chefetes impediu que tivesse no Patriota, onde esteve com um pé em meio em junho – a ponto de o senador Flávio Bolsonaro (Rio de Janeiro) ter se filiado nele.

As nuvens mudaram desde então, o que fez ficar menos improvável a volta do Bolsonaro ao Pp, o partido em que mais tempo esteve filiado em sua longa carreira de mandatos como deputado federal. Ele foi filiado à legenda de 1993 a 2003 (sob as alcunhas Ppr e PpB) e de 2005 a 2016 (já como Pp). Período que explica a brincadeira do senador catarinense Esperidião Amin de que “ninguém se perde na volta para casa”. De julho para cá, a aproximação com o Centrão – do qual o Pp é sócio-fundador no Congresso Nacional – foi tão forte que o senador Ciro Nogueira (Progressistas do Piauí) passou a comandar a Casa Civil do governo. De lá, ele passou a operar não só a articulação política do governo, mas também a diminuição da resistências nos Estados em que o Pp não quer a filiação de Bolsonaro. A avaliação é que com Bolsonaro e seus aliados será possível eleger a maior bancada na Câmara dos Deputados – o que se traduz em maiores fundo eleitoral e partidário, além de tempo de televisão.

O próprio presidente percebeu que o sonho do partido próprio, com papel passado e a chave de todos os diretórios, é muito complicado. Depois da frustração com o Patriota, as opções que surgiram beiravam o ridículo – como a transformação do ultrananico Partido da Mulher Brasileira (Pmb) em Brasil38 ou a adesão ao Democracia Cristão do eterno presidenciável José Maria Eymael. Em ambos teria o controle, mas sem qualquer estrutura já montada e valores ínfimos de fundo eleitoral e partidário. Foi aí que surgiu a tese de que se não era possível ser dono de partido, seria melhor estar em uma legenda de maior porte. E a volta para casa.

Ao longo da semana, a Folha de S. Paulo informou que o trabalho de diminuição das resistências no Pp – especialmente em Estados do Nordeste – está bem encaminhado. Aliado do Planalto, mas ainda resistente à ideia, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (Progressistas de Alagoas) disse que não vai atrapalhar. Restam Bahia e Sergipe como resistentes. Em Santa Catarina, pelo contrário, a torcida é imensa. O próprio Amin disse, no Cabeça de Político, que a filiação de Bolsonaro faria a candidatura própria do Progressistas ao governo crescer muito – e todas as apostas são de que o candidato seria ele mesmo.

Assim, é claro que a filiação de Bolsonaro ao Pp afeta diretamente os planos do senador Jorginho Mello (Pl) de ser o candidato do presidente e de seu inflamado séquito. Sua atuação nos bastidores junto a lideranças bolsonaristas estaduais e a na Cpi da Covid em defesa do governo evidenciam isso. Hoje, ele não teria composição com as siglas de maior porte no Estado – Mdb, Psd e o próprio Pp. Por isso, sua primeira aliança é com o bolsonarismo. Se tiver que dividir Bolsonaro, o projeto enfraquece.

Mas as nuvens bolsonaristas ainda tem uma opção concreta à volta ao Pp. Está no horizonte, ainda de forma mais tênue, a opção pelo retorno do Ptb de Roberto Jefferson, onde esteve entre 2003 e 2005. Eram outros tempos: em 2002, Jefferson apoiou Ciro Gomes (no Pps) no primeiro turno e Lula (Pt) no segundo turno e adentrou o ano seguinte na base de apoio ao petista. Foi nesse contexto que Bolsonaro virou petebista e de lá saiu na esteira do escândalo do mensalão, do qual Jefferson se beneficiou até denunciá-lo – após um indicado do partido ser flagrado em um esquema de propina nos Correios. Bolsonaro deixou o Ptb rumo ao Pfl, deixando bem claro que seria oposição a partir dali.

Depois de cumprir sua pena no caso do Mensalão, Jefferson deu uma guinada radical à extrema-direita e levou adiante o projeto de fazer do Ptb a casa dessa opção política, com direito a troca das cores e mudança no estatuto da legenda. Está à espera de Bolsonaro e oferece uma espécie de guarda compartilhada da sigla. Aqui em Santa Catarina quem toca o projeto de fazer o partido ser o lar da direita bolsonarista mesmo que Bolsonaro não esteja nela é o deputado estadual Kennedy Nunes, que soube cativar lideranças como os deputados estaduais Ana Campagnolo, Felipe Estevão e Jessé Lopes, embora ainda sofra desconfiança de outras. Trabalha para ser candidato a senador.

Se Bolsonaro optar pelo Ptb, vai encontrar em Santa Catarina um projeto já em construção. Mesmo que queira adaptações e que algumas candidaturas sejam privilegiadas em detrimento de outras, é um cenário que mexe menos com a eleição estadual. Seria melhor para Jorginho, pior para a Amin.


Sobre a foto em destaque:

Na Casa Civil, o senador Ciro Nogueira (à direita) trabalha para facilitar a volta de Bolsonaro ao Progressistas. Valdênio Vieira, Presidência da República.

Compartilhar publicação: