O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) encontrou em Chapecó o lugar ideal para o day after à inflamada participação dos irmãos Luis e Luis Ricardo Miranda na CPI da Covid no Senado. A cidade do Oeste montou palco para um ato celebrativo e assistiu à reação do presidente contra senadores de oposição, o Supremo Tribunal Federal e – especialmente – Lula (Pt), com quem vive desde já o maior segundo turno da história do Brasil.

Estava no lugar certo para isso. É possível que Santa Catarina, principalmente o interior, seja o Estado em que se concentra o maior apoio a Bolsonaro no país. Uma relação que não vem de hoje: os catarinenses foram os primeiros a colocar o atual presidente na liderança das pesquisas e lhe deram 75% dos votos no segundo turno em 2018 – percentual que chegou aos 85% em cidades como Joinville, Blumenau e Criciúma. Portanto, não havia lugar melhor para a reação de Bolsonaro.

Ao dizer que “no tapetão não vão ganhar”, o presidente fez uma referência clara à possibilidade de enfrentar um processo de impeachment. E deixou mais claro ainda que vai mobilizar seus apoiadores para enfrentar qualquer tentativa de deposição – até mesmo nas urnas, já que questiona a própria lisura da votação eletrônica, sem apresentar provas da grave acusação. 

A reação de Bolsonaro chega no momento em que a CPI encontrou um fio de meada para puxar. Até agora, por mais barulho que fizesse como palco inquisitório, a investigação do Senado havia se limitando a debates sobre negacionismo, apoio a remédios não comprovados e uma suposta letargia na compra de vacinas – especialmente ao não responder aos reiterados contatos da Pfizer. Questões que podem e devem ser feitas ao governo Bolsonaro, mas que cujo palco correto é a campanha eleitoral, não um inquérito político. 

O que os irmãos Miranda trouxeram na sexta-feira, no entanto, é de outra natureza. É grave a denúncia de que houve pressão para que a compra da vacina indiana Covaxin tivesse tramitação acelerada, com fortes indícios de irregularidades e interesse direto do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (Progressistas-PR). E, pior, com suposto conhecimento do próprio Bolsonaro, alertado pelo Miranda deputado das questões apontadas pelo Miranda servidor da Saúde. A CPI tem agora uma narrativa com densidade para encarar o presidente e o presidente reage. As próximas semanas serão de alta combustão política.

Em termos de política estadual, a garupa de Bolsonaro continuará sendo o local mais disputado pelos postulantes ao governo estadual ano que vem. Na motociata de sábado, o presidente foi salomônico. Levou o prefeito João Rodrigues (Psd) na ida a Xanxerê, trouxe o senador Jorginho Mello (Pl) na volta a Chapecó. É curioso observar essa disputa de bastidores sobre quem será o candidato do presidente. Na raia da construção política, esse nome é Jorginho. É ele que articula as lideranças locais do bolsonarismo para construção de uma chapa, é ele quem defende o governo na CPI. 

O senador Jorginho Mello (Pl) também conquistou um lugar na garupa de Bolsonaro na motociada Chapecó-Xanxerê. Foto: Isac Nóbrega, Presidência da República.

João Rodrigues tem a seu favor a velha amizade do tempo em que ele e Bolsonaro eram vozes quase isoladas contra o petismo na Câmara dos Deputados. O inimigo comum em nível local e nacional. Neste verborrágico segundo turno antecipado entre o presidente e o ex-presidente Lula, talvez a verve do prefeito chapecoense seja útil na campanha eleitoral.

Por falar no segundo turno antecipado, semana passada o ex-senador Jorge Bornhausen fez no programa Cabeça de Político uma ousada profecia de que Bolsonaro não irá para o segundo turno – desalojado por um candidato ainda sem rosto que represente a chamada terceira via. Isso parece altissimamente improvável aos olhos de hoje, mas se acontecer será pela exaustão produzida por um confronto direto entre bolsonaristas e petistas um ano antes da disputa oficial. E porque as forças do poder sempre se mexem quando constatam com antecedência suficiente um impasse indesejável. Dou um exemplo na história. Em 1993, o Brasil parecia condenado a um segundo turno entre Lula e Paulo Maluf (Pds, hoje Progressistas) nas eleições do ano seguinte. Fernando Henrique Cardoso (Psdb), que nem cotado era, venceu no primeiro turno.


Sobre a foto em destaque:

Jair Bolsonaro encontrou em Chapecó um palanque para responder a CPI da Covid. Mesmo palanque que serviu para João Rodrigues (Psd) e Jorginho Mello (Pl) mostrarem alinhamento total ao presidente na disputa de bastidores sobre quem será o candidato dele ao governo estadual ano que vem. Foto: Alan Santos, Presidência da República.

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