Entre o final de maio e meados de julho deste ano, a Operação Alcatraz viveu férias forçadas por decisão do ministro Joel Paciornik, do Superior Tribunal de Justiça (Stj), que determinou a revisão das competências e possibilidade de existência de foros privilegiados ignorados. Para muitos, aquele momento significou que investigação – uma espécie de Lava-Jato catarinense – estava caindo na teia da burocracia judicial e da impunidade correlata a ela. Impressão que rapidamente se desfez quando no mesmo Stj o ministro Herman Benjamin devolveu para a juíza federal substituta Janaína Cassol os 76 processos da Operação Alcatraz, os 28 da investigação conexa denominada Operação Hemorragia e 17 processos sigilosos. Agora, o fim das férias apresenta-se na prática.
Na tarde de segunda-feira, força-tarefa do Ministério Público Federal (Mpf) que coordena as investigações da Operação Alcatraz apresentou mais uma denuncia em relação à apuração de um amplo e sofisticado esquema de corrupção supostamente organizado na Secretaria de Administração entre 2010 e 2018. Desta vez, o Mpf mira 10 pessoas – gestores públicos e empresários – para quem pede a condenação pelos crimes de peculato, corrupção ativa, corrupção passiva e prorrogação contratual fraudulenta e, ainda, a devolução aos cofres estaduais de R$ 30,63 milhões supostamente desviados por meio de fraudes em licitação e prorrogação contratual e superfaturamento no contrato.
Entre os denunciados está o ex-secretário de Administração, Milton Martini (Mdb) – que ocupou o cargo em diversos momentos do mandato compartilhado por Raimundo Colombo (Psd) e Eduardo Pinho Moreira (Mdb) – e o ex-secretário-adjunto Nelson Nappi Junior, figurinha carimbada da Alcatraz. O emedebista foi um dos alvos da Operação Hemorragia, em janeiro, investigação derivada da Alcatraz. Nappi, apontado como homem de confiança do deputado estadual Júlio Garcia (Psd) no suposto esquema, já é réu da Alcatraz por causa das duas denúncias apresentadas anteriormente pelo Mpf e aceitas pela juíza Janaína Cassol. O pessedista não faz parte dessa nova denúncia.
Dos nomes com notoriedade política incluídos na nova denúncia, está o ex-deputado estadual Pedro Bittencourt Neto – que não era parlamentar na época dos fatos investigados. Segundo o Mpf, no período compreendido entre agosto de 2009 e abril de 2010, os denunciados fraudaram, mediante ajustes e combinações, nas fases interna e externa, o caráter competitivo de um pregão presencial da Secretaria de Administração para implantação dos serviços de telefonia IP (VoIP) do governo catarinense. Posteriormente, em 2016, essa contratação, superfaturada, teria sido irregularmente prorrogada, possibilitando a continuidade no desvio de recursos públicos, de acordo com a investigação.
O contrato foi analisado pela Controladoria-Geral do Estado, que apontou superfaturamento mediante o pagamento mensal do valor máximo previsto no contrato, como se o total de 27.664 aparelhos de telefonia IP previstos na licitação tivessem sido instalados desde o primeiro mês da vigência do contrato. O órgão de controle revelou que o número de ramais efetivamente instalados era de apenas 2.330 no início do contrato, chegando a cerca de 16 mil no final da prorrogação contratual, resultando no superfaturamento, em prejuízo ao erário, de mais de R$ 30 milhões.
O portal NdMais apresentou na noite de segunda-feira os nomes dos políticos e empresários denunciados e ouviu contrapontos. Mais detalhes sobre o suposto esquema estão na página da Procuradoria da República em Santa Catarina.
A nova denúncia desnuda um terceiro ramo de fraudes em licitações realizadas pela Secretaria de Administração no período 2010-2018. Nas denúncias já aceitas pela juíza Janaína Cassol, os contratos envolviam terceirizações na área de administração prisional e em serviços de saúde. A nova denúncia ainda precisa ser aceita pela magistrada para que avance no judiciário, quando todos terão o direito de exercer suas defesas. Até onde vai a Operação Alcatraz – a lava-jato catarinense – é difícil prever. Mas parece claro que ainda há muito por vir.
Sobre a foto em destaque:
Ex-secretário de Administração nos governos de Raimundo Colombo (Psd) e Eduardo Pinho Moreira (Mdb), Milton Martini (Mdb) é um dos denunciados pelo Mpf. Foto: Secom, Divulgação.